A Embraer e a Boeing anunciaram em conjunto nesta quinta-feira (3) que continuam trabalhando para estabelecer sua parceria estratégica. No comunicado, as fabricantes apontam que o acordo vai posicionar ambas as companhias “para agregar maior valor às companhias aéreas e seus clientes e acelerar o crescimento nos mercados aeroespaciais globais”.
Segundo os termos da parceria, a Boeing vai assumir o controle das operações de aeronaves comerciais e serviços relacionados a este segmento da Embraer por US$ 4,2 bilhões. A companhia dos EUA deterá 80% da nova empresa, a Boeing Brasil – Commercial, enquanto a Embraer terá os 20% restantes.
A criação da joint venture foi autorizada pelo presidente Jair Bolsonaro em janeiro deste ano e, no mês seguinte, o acordo também foi aprovado pelos acionistas da Embraer.
Como é normal em negociações desse porte, as companhias ainda informam que a transação permanece sujeita a aprovações regulatórios. A conclusão do acordo já foi autorizada pela Comissão Federal de Comércio dos Estados Unidos. Resta agora o sinal verde da Comissão Europeia, que recentemente iniciou uma segunda fase de análises da parceria Boeing-Embraer. Diante disso, as empresas esperam que a negociação seja concluída no início de 2020.
A Boeing deve enfrentar uma investigação antitruste na União Europeia sobre a parceria com a Embraer na área de aviação comercial, informou a agência Reuters em setembro. Processos dessa natureza têm o objetivo de impedir a criação de combinações monopolísticas. É uma forma de coibir empresas de dominarem o mercado e limitarem sua expansão e punir práticas anticompetitivas.
Impulso global
A Embraer e a Boeing também se preparam para criar uma joint venture para “promover e desenvolver mercados” para o avião de transporte multimissão KC-390. Sob os termos da parceria proposta, a Embraer terá uma participação de 51% na joint venture, enquanto a Boeing ficará com os 49% restantes.
Com a força global da Boeing no mercado militar, a parceria no programa KC-390 pode atrair mais clientes para o jato desenvolvido no Brasil. A primeira aeronave foi entregue recentemente à Força Aérea Brasileira e Portugal confirmou a primeira compra internacional do avião. O bimotor da Embraer concorre com o veterano Lockheed Martin C-130 Hercules, turbo-hélice que domina a categoria de cargueiros militares médios desde os anos 50.
Esse mesmo impulso da companhia norte-americana também é esperado com os aviões de passageiros da Embraer. A parceria vai colocar a Boeing na faixa mais baixa dos jatos comerciais, permitindo competir com os modelos CSeries projetados pela Bombardier e renomeados como Airbus A220.
Após um longo e controverso programa de desenvolvimento, os modelos da família CSeries chegaram ao mercado em 2016 e logo depois foram assumidos pela Airbus. Em pouco tempo, sob asa do grupo aeroespacial europeu, as encomendas pelo A220 praticamente dobraram e superaram o backlog da Embraer.
Segundo o balanço comercial mais recente da Embraer, divulgado no segundo trimestre de 2019, a lista de pedidos firmes a entregar continha 363 aeronaves. A Airbus, que divulga seus números todos os meses, tem 428 encomendas pelo A220.
“A ampla parceria estratégica entre Embraer e Boeing, representada por essas duas joint ventures, posicionará as empresas para competir no mercado global, oferecer maior valor aos clientes e impulsionar a indústria aeroespacial brasileira como um todo”, diz o informe das companhias.
Outras divisões da Embraer que devem passar para o controle da Boeing são a ELEB (que produz uma série de componentes de aviões, com destaque na área de trem de pousos), e as unidades de Taubaté (centro de distribuição de materiais e peças para outras fábricas da Embraer), Évora (fábrica de aeroestruturas em Portugal) e Nashville (sede de manutenção da Embraer nos EUA).
O que sobra da Embraer?
Com 50 anos recém-completados, a Embraer vai passar nos próximos anos por sua maior transformação. A instalação histórica em São José dos Campos (SP), onde o pioneiro Bandeirante foi projetado e construído, vai ganhar a fachada da Boeing.
Como a parceria envolve somente os negócios relacionados aos aviões comerciais, as linhas de produção de jatos executivos hoje instaladas em São José serão transferidas para a unidade de Gavião Peixoto, onde tradicionalmente ficam baseados os programas militares da Embraer.
Além da planta em Gavião Peixoto, a Embraer vai manter o controle da fábrica em Botucatu (SP), onde produz estruturas de aeronaves e o avião agrícola Ipanema. A unidade em Melbourne (que finaliza jatos executivos Phenom e Legacy nos EUA) e a OGMA, em Portugal, também serão mantidas.
A “nova casa” da Embraer será a unidade de Eugênio de Melo, em São José dos Campos. O local passa neste momento por uma ampla reforma para concentrar 4.000 funcionários. A instalação será o principal centro de engenharia e tecnologia da empresa e ainda vai abrigar setores de atendimento aos clientes e treinamento, com simuladores de voo, e administração da “nova Embraer”.
Mas a Embraer não vive apenas de fabricar aviões. A empresa brasileira tem importantes divisões que atuam em diferentes aéreas da aviação ou mesmo longe dela, controladas pela Embraer Defesa & Segurança, que inclui a área de aviação militar.
Um dos “tentáculos” da divisão de defesa com maior destaque é a Atech. A empresa desenvolve equipamentos de comando, controle e inteligência dos mais variados tipos, que inclui produtos como sistemas de tráfego aéreo ou softwares e computadores especiais para governos e bancos.
A Atech é um das empresas envolvidas no projetos dos caças Gripen NG da FAB e o consórcio Águas Azuis, selecionado pela Marinha do Brasil para a construção de quatro navios de defesa no Programa CCT – Convertas Classe Tamandaré.
Controle de fronteiras é outro mercado explorado pela Embraer com a Savis Tecnologia e Sistemas. A empresa está envolvida no projeto SIFRON (Sistema Integrado de Monitoramento de Fronteiras), um dos maiores e mais complexos sistemas de vigilância do mundo. O programa deverá ser capaz de monitorar os cerca de 17 mil quilômetros de fronteiras terrestres do Brasil, integrando equipamentos e instalações militares e civis.
A Embraer também tem negócios no espaço com a Visiona Tecnologia Espacial. A empresa é uma joint venture entre a Embraer Defesa & Segurança e a Telebras voltada para a integração de sistemas espaciais.
O principal projeto com participação da Visiona é o Satélite Geoestacionário de Defesa e Comunicações Estratégicas (SGDC-1), realizado em parceria com a franco-italiana Thales Alenia Space. O SGDC-1 foi lançado em 4 de maio de 2017 e tem uma vida útil aproximada de 18 anos. A empresa brasileira foi responsável pela integração dos sistemas a bordo do satélite, que serve para comunicações estratégicas do governo e militares do Brasil.
Por fim, a Embraer também vai manter sua marca no que pode ser o próximo grande mercado da aviação, os eVTOLS, ou “táxis voadores”. A companhia brasileira participa dessa nova corrida dos ares com a EmbraerX, que está preparando uma aeronave com design radical e motorização elétrica para operações em regiões urbanas.
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