Pode-se afirmar agora que o começo do fim do A380 foi decretado. Na semana passada, a Airbus concluiu a produção do último conjunto de asas do maior jato de passageiros da história. Agora o par de asas, cada uma com cerca de 45 metros de comprimento e 35 toneladas, deixará a fábrica da empresa em Broughton, no País de Gales, nos dias 6 e 7 deste mês, de onde serão levadas por barcas até o porto de Mostyn, para serem acomodadas em um navio da Airbus que fará o transporte até o sul da França.
Com isso, se encerrará um período de 13 anos em que a unidade galesa, anteriormente uma fábrica que produziu os bombardeiros Avro Lancaster e Vickers Wellington, foi responsável por dar forma ao imenso componente. Apesar do fim da produção das asas no Reino Unido, a fábrica de Broughton continua a montar as asas dos demais modelos da Airbus e até mesmo do A400M, o transporte militar da empresa. No entanto, o início da vigência do Brexit, saída do Reino Unido da União Europeia, paira sobre o futuro do local.
Como todos os aviões da Airbus, também o A380 é fabricado em diversos partes do planeta, num total de 16 locais, incluindo a Espanha e a Alemanha, além da montagem final em Toulouse. Todos esses lugares passarão pela mesma situação de Broughton à medida que o trabalho nos aviões restantes seja concluído. Estima-se que mais de 3 mil pessoas sejam afetadas pelo fim da produção do gigante, mas ao menos na principal fábrica da empresa já há um destino para o espaço ocupado pelo A380, produzir o A321.
Recentemente, a Airbus anunciou que usará a linha de montagem do quadrirreator para ampliar a produção do A321, aeronave que tem se tornado muito popular ultimamente. A fabricante, inclusive, afirmou que criará uma linha de produção “digitalizada” que será capaz de torná-la mais eficiente e flexível. O início de funcionamento deve ocorrer em 2022, se juntando à Hamburgo e à Mobile, nos EUA, onde o A321 também é montado.
De solução à fracasso
Com a entrega do terceiro e último A380 da All Nippon Airways prestes a ocorrer, restam apenas oito jatos encomendados pela Emirates, a maior operadora da aeronave no mundo. Segundo o relatório de encomendas e entregas da Airbus de dezembro, o A380 obteve 251 pedidos dos quais 242 haviam sido entregues até o fim de 2019. Desses, dois já foram desmantelados por falta de interessados, caminho que deve ser seguido por outros exemplares em breve.
A Airbus já demonstrava interesse em entrar no mercado de jatos grande capacidade desde o final dos anos 80 e chegou até a iniciar conversas com a Boeing para lançar um produto em conjunto, diante da demanda pequena do segmento. Mas em 1994, ela decidiu lançar seu próprio programa, então chamado de A3XX, mesmo com poucos interessados.
Após anos de estudos, a Airbus lançou o A380 no final de 2000 com cerca de 50 pedidos de seis clientes. O jato, de dois andares inteiros, teve o projeto concluído em 2001 e já no ano seguinte foi iniciada a fabricação dos primeiros protótipos. No entanto, o ataque terrorista de 11 de Setembro de 2001 nos EUA colocou a aviação comercial em um período de baixa e o programa do A380 acabou levando muito tempo para concluir o primeiro avião de teste, que foi revelado apenas no início de 2005.
O primeiro voo ocorreu em abril de 2005, mas a certificação só foi obtida no final de 2006. A Singapore Airlines, cliente lançadora do modelo, iniciou sua operação quase um ano depois, em 25 de outubro de 2007. No entanto, no ano seguinte a crise econômica mundial fez os preços do petróleo dispararem e mudar a maneira como as companhias aéreas enxergavam o futuro. Ao mesmo tempo, a Boeing, que havia abortado os planos de criar um “superjumbo”, preferiu investir em um novo jato widebody de média capacidade e projeto avançado, capaz de reduzir o consumo de combustível e oferecer um voo mais agradável aos passageiros e tripulantes. Esse avião, o 787, passou a dar o tom da aviação comercial na década seguinte.
Atingido por um período de vacas magras e sendo uma aeronave difícil de operar por conta dos requisitos extras exigidos dos aeroportos, o A380 só durou mais tempo porque a Emirates encontrou nele o modelo ideal para seu hub em Dubai. Com mais de uma centena de jatos, a companhia aérea criou uma malha incomparável além de tratar o quadrirreator como um diferencial em relação às suas concorrentes.
A Emirates acabou sendo decisiva para a sobrevivência do A380 por mais alguns anos, assim como “decretou” o fim do modelo no ano passado ao cancelar parte de sua encomenda. Sem a cliente, a Airbus não teve outro caminho senão o de aposentar o maior avião de passageiros da história. A honra de receber a última unidade no início de 2021 caberá, obviamente, à empresa dos Emirados Árabes Unidos.
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