Em 11 de julho de 1986, a 22 km de Bakersfield, na Califórnia, um grande incêndio consumiu 150 acres de floresta após a queda de uma aeronave durante a madrugada.
Os bombeiros foram chamados e o local tomado por autoridades estaduais e federais, que observaram o trabalho dos profissionais durante longas 16 horas de combate ao fogo.
Ao final, foram obrigados a assinar termos de confidencialidade para acessar o local dos destroços, tanto bombeiros quanto policiais e agentes locais.
O que se viu foram os destroços de um avião secreto na época desconhecido do grande público.
Algo que voava somente à noite e que fora descrito como um Objeto Voador Não Identificado (OVNI) em Nevada.
Essa aeronave era um caça-bombardeiro Lockheed F-117A Nighthawk, o primeiro avião stealth (invisível aos radares) operacional do mundo, que só foi reconhecido pela Força Aérea dos EUA (USAF) em 10 de novembro de 1988.
Todavia, na ocasião, a queda do F-117, um projeto altamente secreto da USAF, vitimou o Major Ross E. Mulhare (, com 35 anos à época, natural de Fall River, Massachusetts. Essa foi a primeira queda oficialmente reconhecida.
Em investigação posterior, foi determinada como causa do acidente a “desorientação espacial” do piloto, que colidiu em uma encosta a 695 m de altitude, perto do Rio Kern.
O local foi declarado de segurança nacional e o espaço aéreo foi fechado para a aviação comercial e civil num raio de 5 milhas (8 km) e em altitude inferior a 8.500 pés (2.590 m). O impacto foi tão forte que a “ruptura estrutural foi quase completa”.
Qual teria sido a causa?
Mulhare relatou a um colega que estava ficando cada vez mais cansado e que não conseguia se livrar da situação. Mesmo assim, sua missão secreta e seu senso de dever — que ele ocultava da família, logicamente — o obrigavam a decolar, como fez às 1h13 do dia 11.
Tendo partido da Base Aérea de Nellis, Mulhare seguiu seu plano de voo como um avião comum, com luzes de sinalização, transponder e comunicação no indicativo ARIEL31.
Todavia, ao curvar e descer em direção à Base Aérea de Edwards, Mulhare foi autorizado a descer para 17.000 pés e então, às 1h45, ele desapareceu dos radares.
O ângulo de descida teria sido de 20 graus, mas investigações mais apuradas indicaram que beirararm os 60 graus.
Seja como for, Mulhare bateu com o F-117A #81–792 com os motores ligados. Ele nem mesmo acionou o sistema de ejeção do assento.
A dificuldade em apagar os sinais da queda motivou a Força Aérea a agir de forma surpreendente. Após vasculhar a enorme área, incluindo alguns trechos no subsolo, oficiais da USAF decidiram utilizar um caça F-101 Voodoo que estava armazenado como se fosse a aeronave acidentada.
O jato foi feito em pedaços e então suas peças espalhadas pelo local. Por fim, foi chamada uma equipe de TV para visitar a região da queda e registrar o F-101 “acidentado”, num típico roteiro de filmes sobre OVNI.
Segredo em família
Na época, o jornal The New York Times publicou uma matéria dizendo que Mulhare “enganou sua família” ao alegar que era um piloto de um esquadrão “Aggressor” na USAF.
Ou seja, que simulava combates contra aviões da Força Aérea, se comportando como um piloto soviético, sendo que em realidade, pilotava um jato ultrassecreto.
A imprensa da época chegou à conclusão rápida de que o avião era mesmo ultrassecreto fabricado pela Lockheed, mas não se sabia exatamente se ele era um caça de combate ou um bombardeiro.
A USAF sempre negou qualquer informação sobre a aeronave e isso só aumentava a curiosidade da opinião pública americana, pois se sabia que a Força Aérea voava aeronaves desconhecidas.
No final, Ross E. Mulhare, que deixou esposa e quatro filhos, foi declarado herói por sua família e opinião pública. Ele tinha somente 53,5 horas de voo no F-117.
Hoje, sabe-se que todos os acidentes fatais (três) com a aeronave, se deram com pilotos com menos de 100 horas, atualmente o limite mínimo aceitável para missões.
Enquanto isso, à época, um dos frutos mais impressionantes da secretíssima Skunk Works, com suas formas multifacetadas e RCS de 0,001 m², continuava oculto na escuridão da noite.
Segunda queda
Pouco mais de um ano após a morte de Mulhare, outro acidente envolvendo o F-117 (#83–815) vitimou mais um piloto da USAF, o Major Michael C. Stewart. Há pouca informação sobre ele, mas o que se sabe é que tinha 76,7 horas de voo na aeronave.
No dia 14 de outubro de 1987, Stewart voava o F-117 sobre o campo de tiro da Base Aérea de Nellis, quando o controle do tráfego aéreo identificou um desvio de trajetória incomum e o avião caiu às 20:33.
O impacto ocorreu “em um ângulo acentuado, cavando um buraco de aproximadamente dois metros e meio”, segundo o relatório. Também foi relatado que o F-117 “estava com o nariz ligeiramente para cima e uma inclinação moderada para a esquerda”.
Stewart voava numa noite clara e com as luzes do campo de tiro acesas. Como Mulhare, o piloto também não tentou se ejetar e a causa provável é igualmente a desorientação espacial.
A localização da queda foi mais difícil para a USAF e se tornou pública, mas o Pentágono, na época, se limitou a dizer: “Há um avião desaparecido… Isso é tudo o que podemos dizer.” O F-117 foi localizado a 72 km a nordeste de Scotty’s Junction.
Projeto defasado
Concebido a partir do protótipo Have Blue, o F-117 apostava em superfícies facetadas, ângulos pronunciados e motores escondidos do solo para reduzir sua assinatura de radar. Além disso, a aeronave recebeu uma ‘pintura’ com materiais que absorviam a radiação emitida por radares.
Apenas 64 aeronaves foram finalizadas, incluindo cinco protótipos e o Night Hawk foi um grande ativo para a Força Aérea dos EUA durante os anos 80 e 90.
Em 1999, no entanto, um F-117 foi abatido sobre a Sérvia por um míssil terra-ar de origem soviética. O piloto sobreviveu e foi resgatado mas os destroços do jato acabaram sendo recuperados por forças locais e supostamente acessados pela Rússia.
Na época, houve estranhamento já que o procedimento comum nesses casos é lançar mísseis sobre os destroços para destruir informação confidencial, mas a USAF afirmou que o F-117 já usava tecnologia defasada.
Ou seja, num espaço de 13 anos, o jato da Lockheed passou de um um projeto ultrassecreto para obsolescência.