Com uma situação insustentável dentro da empresa, Dennis Muilenburg deixou o cargo de executivo chefe da Boeing nesta segunda-feira, 23. Ele será substituído por David Calhoun, que havia assumido a posição de chairman da fabricante em outubro, função que também era acumulada pelo então CEO. No entanto, Calhoun só assumirá como CEO em 13 de janeiro, cabendo ao atual chefe de finanças da Boeing, Greg Smith, atuar como executivo chefe interino.
A troca de comando na Boeing foi anunciada pelo Conselho de Administração da companhia que alegou que “era necessária uma mudança de liderança para restabelecer a confiança na empresa em avançar, pois trabalha para reparar o relacionamento com as agências reguladoras, clientes e todos os demais acionistas“. A fabricante também se comprometeu a ter “total transparência, incluindo comunicação eficaz e proativa com a FAA, outros reguladores globais e seus clientes“.
“Em nome de todo o Conselho de Administração, estou satisfeito por Dave ter concordado em liderar a Boeing neste momento crítico“, afirmou Lawrence Kellner, novo chairman da empresa, que acrescentou: “Dave tem uma profunda experiência no setor e um histórico comprovado de forte liderança, e reconhece os desafios que devemos enfrentar. A diretoria e eu esperamos trabalhar com ele e o restante da equipe da Boeing para garantir que hoje seja um marco importante em um novo caminho a seguir para a nossa empresa“.
As mudanças também atingiram a equipe de relações públicas da Boeing com o anúncio de que Niel Golightly será o vice-presidente sênior de comunicações da empresa, a partir de 1º de janeiro de 2020. Ele sucederá Anne Toulouse, que já havia manifestado intenção de se aposentar.
Vexames seguidos
A queda de Muilenburg veio na esteira de outro fracasso da Boeing, o lançamento da nave Starliner, que deveria ter enviado mantimentos para a Estação Espacial Internacional (ISS) em uma missão de 10 dias, mas por erros de projeto, uma anomalia fez com que a cápsula consumisse mais combustível do que o previsto e ela acabou sendo trazida para a Terra mais cedo. Foi, no entanto, o primeiro pouso de uma cápsula americana em solo na história.
Mas o estopim para a saída do CEO foi mesmo sua estratégia errante à frente dos problemas com o 737 MAX. Desde o primeiro acidente há pouco mais de um ano, Muilenburg buscou minimizar o impacto da crise, mostrando-se otimista quanto ao desfecho do caso. No entanto, nove meses após o aterramento do jato, não há previsão segura sobre quando ele voltará ao serviço. Essa indefinição tem afetado muitas clientes que postergaram diversas vezes o retorno do avião à operação.
Matéria do jornal The New York Times neste fim de semana revelou que o executivo se indispôs com o atual diretor da agência de aviação civil dos EUA (FAA), Stephen Dickson, no primeiro encontro frente à frente entre os dois desde julho. Dickson repreendeu Muilenburg por ter colocado pressão na agência para liberar o jato para ser entregue a seus clientes em dezembro mesmo sem ter aprovado a solução para torná-lo seguro.
O ex-CEO declarou em novembro que havia interpretado que a FAA liberaria o 737 MAX em dezembro, colocando fim na crise causada pelos dois acidentes fatais. Mas a agência viu a manobra como uma espécie de ameaça já que se o avião não pudesse voar para seus clientes causaria danos enormes à toda a cadeia produtiva e, por tabela, milhares de empregos. Dickson não só rebateu as insinuações como colocou em dúvida o trabalho da Boeing além de deixar no ar que falta ainda cumprir muitos requisitos para a aeronave voltar a ser segura.
O conselho da Boeing, que sempre deu retaguarda para Muilenburg em outras ocasiões, viu-se pressionado a tirá-lo do cargo na última semana, o que acabou sendo inevitável para estancar a crise.
Comunicação confusa
A postura da Boeing durante toda a crise tem sido ambígua. Primeiro, negou o óbvio chegando a questionar outros problemas alheios ao avião. Quando ficou claro que o sistema MCAS, que deveria ajudar os pilotos em situações de nariz elevado, foi o epicentro da sequência de erros, a fabricante passou a repetir exaustivamente que se preocupava com a segurança de seus aviões e que se juntava ao sofrimentos dos familiares que perderam seus entes nas duas tragédias. Ao mesmo tempo, Muilenburg continuou bancando uma solução rápida para o caso, evitando que a linha de produção fosse afetada. Como o desfecho não ocorreu como esperado, a fabricante tomou a inédita decisão de suspender a produção do 737 MAX a partir de janeiro.
Espera-se que agora Calhoun e sua nova equipe de comunicação mudem de fato a forma de lidar com o grave caso.
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