Poderia ser o fim da participação da Bombardier na indústria aeronáutica, mas a fabricante canadense anunciou nesta segunda-feira, 17, que seguirá com sua divisão de aviação executiva. Com dívidas bilionárias, a empresa optou por se desfazer de outra área importante, a Bombardier Transportation, que fabrica trens, monotrilhos, locomotivas e sistemas associados. Essa divisão será incorporada pela francesa Alstom, que pagará US$ 8,2 bilhões (mais de R$ 35 bilhões).
A Bombardier deverá ficar pouco mais da metade desse valor, após arcar com dívidas, encargos de pensão e o repasse do que pertence ao governo da provínica de Quebec, também sócio nesse negócio. A companhia informou que um memorando de entendimento foi assinado recentemente e que ainda evoluirá para um contrato que será analisado pelas autoridades regulatórias dos países envolvidos.
“Hoje marca um novo capítulo emocionante para a Bombardier. No futuro, concentraremos todo o nosso capital, energia e recursos em acelerar o crescimento e impulsionar a expansão de margem em nossa franquia de aeronaves executivas, líder de mercado, com US$ 7 bilhões”, afirmou Alain Bellemare, presidente da Bombardier.
A divisão executiva da Bombardier é formada por aeronaves projetadas originalmente pela Canadair e pela Learjet, que foram absorvidas décadas atrás. A fabricante é uma das principais concorrentes no mercado de jatos de longo alcance cuja principal estrela é o Global 7500, um dos maiores jatos executivos do mundo.
No ano passado, a Bombardier também colocou em serviço os modelos Global 5500 e Global 6500 e o portfólio conta ainda com o Challenger 350 e Challenger 650. No segmento de menor capacidade, a empresa aposta no novo Learjet 75 Liberty. A Bombardier afirma que tem uma carteira de US$ 14,4 bilhões e que espera entregar 160 ou mais aeronaves em 2020. Mesmo assim, rumores indicavam que ela poderia vender o negócio para a Textron, dona da Cessna e da Beechcraft.
De quase gigante à quase falida
O histórico da Bombardier nas últimas décadas impressiona pela enorme frustração de expectativas. O grupo foi por muito tempo o principal concorrente da Embraer no mercado de aviões regionais, chegando a travar diversas disputas comerciais, com trocas de acusações sobre incentivos em suas vendas.
De uma empresa que surgiu para produzir trenós, a Bombardier aos poucos foi engolindo outras empresas e acessando segmentos novos. Na aviação, sua investida passou pela tradicional De Havilland Canada, então especializada em turboélices regionais, e pela histórica Canadair que, a despeito da atuação na aviação militar, havia lançado um dos primeiros jatos executivos de grande capacidade do mercado, o Challenger. Mais tarde foi a vez da americana Learjet, uma das pioneiras do mercado corporativo.
Nos anos 90, a Bombardier decidiu utilizar a célula do Challenger para lançar uma bem sucedida linha de jatos regionais, a CRJ, que foi uma dura concorrente dos ERJ da Embraer. No entanto, quando a empresa brasileira criou os E-Jet deu a volta por cima e passou a dominar o mercado graças aos seus produtos mais capazes.
A resposta da Bombardier prometia ser uma dor de cabeça para a Embraer, mas o programa de jatos C Series se transformou num monstro consumidor de dinheiro, deixando a empresa com dívidas volumosas. Embora seja um primor técnico, a nova família teve seu desenvolvimento postergado várias vezes, culminando com a desesperada venda para a Airbus, que os transformou no A220.
Sem os turboélices da DHC, os jatos da CRJ (repassados para a Mitsubishi Aircraft) e fora do programa A220 desde a semana passada, resta a Bombardier lutar por um lugar ao sol no complicado mercado de aviação executiva. Pode ser que essa triste história ainda não tenha acabado.
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