Em 1985, a Força Aérea Brasileira estava considerando algumas poucas possibilidades em aviação de caça, já que estava com problemas para ampliar a frota de Northrop F-5 Tiger II e não havia muitas opções que se encaixassem em seu limitado orçamento. Uma rara exceção era uma versão do lendário MiG-21 fabricado na China, o Chengdu F-7M.
Nesse tempo, a FAB ainda contava com o primeiro lote de 42 caças F-5, sendo 36 da versão E (monoplace) e 6 B (biplace) adquiridos novos por US$ 115 milhões e recebidos entre 1973 e 1976. Fora isso, a força dispunha também de um lote de 17 Dassault Mirage III D/E na defesa aérea da capital federal, em Anápolis (GO).
Naturalmente, o Brasil procurou os EUA para ampliar a frota de F-5, mas estava tendo dificuldades em fazê-lo. Como se tratava mais de uma compra no âmbito político do que comercial, em especial quando se negociava com os americanos, incertezas eram sempre presentes.
Então, a FAB começou a considerar junto ao governo outra possibilidade para o país. Foi nessa época que Brasília decidiu se aproximar de Pequim, capital do segundo maior país comunista na época, depois da URSS. Em plena Guerra Fria, o Brasil vislumbrou a aquisição de um caça chinês, o F-7M.
MiG-21 chinês
Esta era a designação local para o caça Mikoyan-Gurevich MiG-21, já bastante famoso e com muitos combates no currículo. A fabricação do jato russo era feita pela Guizhou Aircraft Industry Corporation, a GAC, que fica em Chengdu, província de Sichuan.
A designação F-7M Airguard era para a versão de exportação do caça, que internamente era chamado de J-7 Jianjiji. Como não se compra algo sem testar, o Brasil obviamente experimentou o produto antes de levar para casa, tendo assim constatada maneabilidade, robustez e poder de fogo do jato.
Passaram-se dois anos e o debate interno entre comprar ou não o Chengdu F-7M se intensificou. O governo estava aguardando, pois a análise técnica deveria ser concluída pela FAB, já que não se tratava exatamente de uma compra “política”. Na época, a questão ideológica foi colocada de lado, segundo o próprio Ministério da Aeronáutica.
Tanto é que havia a questão do off-set, pois a oferta chinesa compreendia 30 unidades do Chengdu F-7M com armamento e sobressalentes, mas sem nenhuma compensação comercial, o que ia contra aquilo que o governo brasileiro estabelece até hoje.
O pacote chinês incluía ainda um motor adicional para cada aeronave, mais treinamento de pilotos e equipes de manutenção. Aliás, previa-se que esta seria transferida para a CELMA (Companhia Eletromecânica de Aviação, hoje parte da gigante GE).
Entre as armas, o Brasil receberia os mísseis PL2 e PL2A, guiados por infravermelho e com alcance entre 5 e 10 km. Também não estava descartado o PL-7, que era um correspondente chinês ao francês Magic 2, da Matra. Aliás, de mesma origem, bombas guiadas a laser também estavam no pacote.
Na ocasião, a imprensa informava que o Chengdu F-7M, apesar de um projeto antiquado, tinha armas mais modernas que o F-5 usado pela FAB, tais como capacidade do míssil PL-7, capaz de abater alvos de frente e em azimute de 180°, algo que o AIM-9B Sidewinder do jato americano não fazia.
Além disso, o Chengdu F-7M chegaria com o HUD, visor de navegação e aquisição de alvos, que não existia nos caças usados no Brasil. O Jornal do Brasil, em 1987, descreveu outros sistemas do jato sino-soviético: “…um radar exclusivamente telemétrico, um radar altímetro, instrumentos UHF e VHF de comunicações, além de um inversor tipo ‘solid state’”.
Havia dois grupos dentro da FAB que tinham opiniões diferentes sobre o assunto. Uma apoiava a compra por se tratar de um jato supersônico e com armamento no pacote, mas outro apontava como entraves as dificuldades logísticas e seu projeto antiquado.
Como ele era?
O Chengdu F-7M é um avião monoposto de 14,8 metros de comprimento e 8,3 m de envergadura, tendo 4,1 m de altura e peso máximo de decolagem de 9.100 kg, podendo levar uma variedade grande de armas, que inclui mísseis ar-ar, ar-terra, bombas e foguetes em quatro cabides sob as asas. Ele portava um canhão de 23 mm.
O F-7M tem um motor turbojato de 14.550 libras de empuxo com pós-combustão, alcançando 2.175 km/h (Mach 2), tendo raio de combate de 850 km ou 2.230 km de traslado. O avião da GAC leva 2.340 litros de querosene com mais 490 em tanques externos e alijáveis.
Tendo decolado pela primeira vez em 17 de janeiro de 1966, o Chengdu F-7 teve mais de 2.400 unidades produzidas na China entre aquela data e março de 2017, quando o último saiu da linha de produção. Só o MiG-21 teve 10.655 exemplares feitos em sua história.
Olhando para frente
De fato, a oferta chinesa parecia tentadora, já que o contrato seria de US$ 150 milhões com tudo acima descrito, o que daria algo em torno de US$ 5 milhões por caça. Isso sem contar os custos menores que os de um Mirage III, por exemplo.
O motor Wopen WP-7B, versão chinesa do Tumansky R-11 soviético, tinha preço unitário de US$ 600 mil e um ciclo de vida de apenas 600 horas/voo, enquanto um Snecma Atar 9-C do Mirage III custava US$ 3 milhões e tinha 900 horas de uso.
Comentava-se que o F-16 custaria ao Brasil nada menos que US$ 25 milhões por unidade. Ou seja, 5 vezes mais. Fora isso, fontes – supostamente de origem chinesa – davam conta de que o acordo entre o Brasil e China após os 30 primeiros aviões seria muito mais amplo e duradouro.
Falava-se num pacote de até 110 aeronaves no total e que, em contrapartida, o governo chinês aceitaria a compra de bens brasileiros, entre eles locomotivas, vagões, radares para aeroportos, computadores, maquinário agrícola e também aviões.
Neste caso, os chineses estariam de olho nos modelos Tucano e Brasília da Embraer. O contrato, no total, seria de US$ 600 milhões em compras para cada lado. No entanto, o negócio não avançou apesar das conversas entre os dois lados.
F-5 voltou à pauta
No final de 1987, a FAB recebeu um orçamento de Cz$ 118,7 bilhões para 1988 e contemplou Cz$ 3,5 bilhões para o desenvolvimento do caça de ataque AMX (A-1). Com reajuste de 498% em relação a 1987, a Aeronáutica voltou a insistir no F-5.
Negociada com o governo Reagan, a compra de um segundo lote de F-5 foi acertada por US$ 13,1 milhões no mesmo ano, sendo 26 F-5E/F usados dos excedentes da Força Aérea Americana (USAF).
Por conta disso, ficou difícil manter um plano de aquisição do Chengdu F-7M, ainda mais que o Brasil também vislumbrava o desenvolvimento de um caça próprio, que tomaria corpo no começo dos anos 90 sob a designação MFT-LF.
Este, porém, não saiu do papel e somente agora, 42 anos depois, é que a FAB está perto de adquirir seu caça definitivo, o Saab Gripen NG. Entretanto, se a negociação com a China fosse feita hoje, o produto em questão provavelmente seria o moderno Chengdu J-10, o novo caça chinês de exportação, mas desta vez um projeto original do próprio país.
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Tudo que eu compro da China é barato e porcaria…. será que na aviação seria diferente ?
Matéria muito boa! Mas faltou dizer que as aeronaves chinesas foram testadas por um oficial-aviador brasileiro com a patente de Brigadeiro da Reserva. Ele voou com a aeronave, mesmo sabendo que a FAB desistiu da compra, não pelos fatores comerciais acima relatados, mas pela pressão do governo norte-americano que chegou a ameaçar sanções comerciais contra o Brasil! E concordou em liberar a venda mais F-5’s ao Brasil. O Brasil inclusive havia cogitado adquirir F-5’s de Cingapura! Mas o translado que teria que ser feito voando, previa uma perna de 14.000 km de voo ininterrupto! E para testar se o F-5 aguentaria tal proeza o mesmo Oficial que testou os MIgs Chineses, e que estava ainda na ativa ensaiou o voo percorrendo o Brasil de norte a Sul até completar os 14.000 km em voo de forma ininterrupta. Depois a aeronave foi analisada e recebeu laudo positivo da manutenção. E claro que esse voo teria reabastecimento, mas na época já haviam pelo menos 4 B-707 quadrirreatores ex-Varig convertidos em aeronaves KC-135!
Bela matéria. Eu gostaria que o F-7 tivesse sido adquirido pela FAB. Como bem diz a matéria, hoje estaríamos com o J-10.
O Mig21 foi um verdadeiro desastre na guerra dos 6 dias. As forças aeras siria e egipcia foram esmagadas pois o MIG21 foi facilmente batido pelos Mirage e Phantom israelenses. Se o Brasil tivesse comprado essa bomba, o governo cairia.