Caças modernos que não decolaram

Países sem tradição na indústria aeronáutica ou ainda sem experiência (e dinheiro) projetaram caças que poderiam ter mudado a mudado a história

Os projetos de aviões de combate sofrem diversos atrasos e, em alguns casos, acabam sendo cancelados por motivos variados, que podem ir da falta de dinheiro até questões políticas. Nos últimos 30 anos, pelo menos oito caças com ideias avançadas não decolaram, no sentido de não serem concluídos e entrarem em produção.

Apesar do esforço de seus fabricantes em colocá-los na linha de produção, muitos problemas acarretaram o engavetamento de tais projetos, que poderiam mudar muito a geopolítica de alguns países e elevar o nível de independência em relação às grandes potências militares.

Países com pouca tradição na indústria aeronáutica ou ainda buscando experiência no setor militar se aventuraram a fazer caças modernos. Ou tentaram… Fabricantes da Argentina, África do Sul, Romênia e até no Brasil, com a Embraer, sugeriram novas aeronaves, algumas com ideias interessantes.

Caros e complexos demais para serem produzidos nos países onde eram desenvolvidos naquele momento, a maioria desses caças não saíram nem do papel ou foram apresentados apenas como maquetes.

IAI Lavi

(Bukvoed/Creative Commons)
O design do Lavi lembra muito o do famoso caça F-16 da Lockheed-Martin (Bukvoed/Creative Commons)

Durante os muitos embates aéreos da Hel HaAvir (Força Aérea de Israel) nos anos 1980, provou-se a necessidade de incluir na frota um caça nacional de quarta geração para substituir o famoso Kfir da IAI. Então, a Israel Aircraft Industries desenvolveu o projeto Lavi (leão em hebraico).

Com um desenho muito parecido com o F-16 dos EUA, o IAI Lavi tinha como diferencial principal as asas em delta e canards para estabilização, posicionados na frente. Tendo 14,57 metros de comprimento e 8,78 de envergadura, o israelense tinha peso máximo de decolagem de 19.277 kg.

Além disso, o IAI Lavi podia voar a 1.965 km/h e permitia um alcance de combate de 3.700 km. Usava um turbofan PW1120 da Pratt Whitney com 20.600 libras de empuxo e tinha teto máximo de 15.240 metros. Era equipado originalmente com um canhão DEFA de 30 mm.

(Reprodução)
O primeiro voo do IAI Lavi aconteceu em 31 de dezembro de 1986 (Reprodução)

Devido ao enorme custo da defesa de Israel nos anos 1980, que consumia 24% do PIB do pequeno país, o projeto Lavi teria US$ 1,5 bilhão do orçamento, sendo assim considerado proibitivo e obviamente cancelado antes de 1990.

Atlas Carver

A África do Sul passou décadas de isolamento por conta de sua política do Apartheid. Essa postura, no entanto, levou ao desenvolvimento da indústria bélica no país, capitaneado pela Atlas Aircraft Corporation.

Após adquirir experiência no desenvolvimento do Atlas Cheetah, considerado a versão modificada mais avançada do tradicional Dassault Mirage III, a fabricante sul-africana sugeriu a criação de um caça totalmente, o Carver.

(Reprodução)
O Atlas Carver foi apresentado apenas como uma maquete em pequena escala… (Reprodução)

Com design inspirado no Mirage 4000 (que não passou do protótipo), o Atlas Carver tinha duas entradas de ar verticais que lembravam o antigo Panavia Tornado. Esse avião também tinha capacidade de ataque terrestre e suíte de aviônica digital, com operação plena de mísseis BVR (para ataques além do alcance visual). Mas havia um problema, os motores só podiam ser do modelo Atar 9K50, o mesmo do velho Mirage 50, por causa do embargo.

Outro empecilho era o preço do projeto, que previa consumir cerca de US$ 2 bilhões. Entre o final da década de 1980 e início dos anos 1990, a Africa do Sul também já não sofria mais a ameaça constante de conflitos fronteiriços, o que desmotivou ainda mais o conclusão do Carver.

Sem razões para continuar com a aeronave, que poderia ser o primeiro caça desenvolvido e fabricado na África, o governo cancelou o projeto em 1991. Anos depois, em 2008, a vaga que em tese deveria ser ocupada pelo delta africano acabou sucedida pelo Saab Gripen.

FMA SAIA 90

Na vizinha Argentina, o desenvolvimento de caças é algo que os hermanos conhecem desde os anos 1950, mas com a crise atual, o máximo que podem fazer é o modesto Pampa. Porém, algum tempo atrás, o FMA SAIA 90 prometia superioridade aérea nacional e algo mais.

Na década de 1980, a Fabrica Militar de Aviones (FMA) em colaboração com a alemã Dornier, desenvolveu o projeto de um novo avião, dentro do programa ACA (Avión Caza Argentino). O diferencial desse caça era sua furtividade.

O caça argentino era projetado para evitar a detecção por radares (Reprodução)
O caça argentino era projetado para evitar a detecção por radares (Reprodução)

Com dois turbofans GE F-404 e empenagem vertical dupla, o FMA SAIA 90 seria um dos poucos caças stealth não pertencentes às grandes potências. Apesar de seu desenho, ele previa o uso de mísseis ar-ar nas pontas das asas e pontos externos para armas e tanques alijáveis.

O SAIA 90 tinha ainda canhão Mauser de 27 mm e capacidade para lançar quatro mísseis de longo alcance do tipo BVR. A ficha técnica do avião apontava capacidade para transportar 5.000 kg de bombas e mísseis ar-terra/superfície. Embora tenha buscado parceiros, a FMA viu o projeto sucumbir diante da crise econômica em seu país, no começo dos anos 1990.

Embraer MFT-LF

A Força Aérea Brasileira (FAB) entrou na década de 1980 com algumas dezenas de unidades do caça F-5 e quase duas centenas do AT-26 Xavante. Para substituir o segundo, foi elaborado o projeto do AMX em parceria com empresas italianas.

(Reprodução/Bivoador)
O MFT-LF perdeu a chance de ser o primeiro caça supersônico brasileiro (Reprodução/Bivoador)

Mas, no caso do F-5, a FAB tentou algumas alternativas para ampliar a frota deste e encontrar um sucessor. Diante das dificuldades lá fora, decidiu-se por um projeto nacional, com base na experiência que estava sendo adquirida com o AMX durante aquela década.

Assim, através da Embraer, surgiu o MFT-LF. Tratava-se de um caça tático leve que tinha ainda a função de treinador avançado, substituindo parte dos Xavantes usados nessa tarefa. Com um turbofan Rolls-Royce/Snecma dotado de pós-combustor, o jato poderia passar da velocidade so som, voando a mais de 1.600 km/h.

(Reprodução/Bivoador)
O MFT-LT poderia ser utilizado como caça ou como avião a jato de treinamento avançado (Reprodução/Bivoador)

Medindo 11,25 metros de comprimento e 8,70 de envergadura, o Embraer MFT-LF tinha 4,03 metros de altura, compartilhando itens com o AMX. Infelizmente, o governo brasileiro não tinha interesse em financiar o caça sozinho e como não houve interessados estrangeiros, o projeto do que poderia ser o primeiro caça supersônico brasileiro foi cancelado.

IAR 95

Antes da queda do Muro de Berlim e do Pacto de Varsóvia, a Romênia já projetava um novo avião de combate em plenos anos 1980. Foi um caça supersônico que teve dois fins, o primeiro em 1981 e o segundo em 1988.

Desenvolvido pela Avioane Craiova, o IAR 95 era um caça que lembrava em parte o F-4 Phantom na dianteira e com asas parecidas com as do F-16 Fighting Falcon. O jato romeno tinha 16 metros e outros 9,3 de envergadura e deveria ser equipados com motores a jato russos Tumansky de 27.500 libras,

(Reprodução)
O IAR 95 foi outro caça que não passou da fase de desenhos… (Reprodução)

Seu peso máximo de decolagem era de 15.200 kg, sendo 3.200 kg de armamentos. Projetado no início dos anos 1970, o IAR 95 acabou cancelado em 1981. Porém, os planos foram atualizados e retomados em seguida, prevendo a participação da então Iugoslávia.

Esta acabou declinando em favor de um projeto próprio (que você confere a seguir), deixando a Romênia sem condições de mantê-lo sozinha, o que levou ao fim do IAR 95 pouco antes da queda do bloco comunista no Leste Europeu.

Novi Avion

Decidindo não colaborar com os romenos no IAR 95, o governo de Belgrado decidiu-se por algo mais moderno, um caça avançado que utilizava controles canards e asas em delta, porém, estas eram curtas. O projeto foi desenvolvido pela fabricante local SOKO.

O design do caça iugoslavo lembrava o do Rafale (Reprodução)
O design do caça iugoslavo lembrava o do Rafale, mas monomotor (Reprodução)

Previsto para entrar em serviço no final dos anos 1990 ou começo de 2000, o Novi Avion – denominação comercial da aeronave – tinha como função substituir o MIG-21 na Força Aérea da Iugoslávia. Ele seria equipado com motor Snecma M88, o mesmo do Dassault Rafale.

O Novi Avion era projetado para voar a 2.000 km/h e percorrer até 3.765 km, com um peso máximo de decolagem de 13.400 kg. O Novi Avion media 13,75 metros de comprimento, 4,87 de altura e 8 de envergadura. Tinha ainda um canhão de 30 mm.

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Coleção de maquetes: O Novi Avion foi outro caça ousado que não virou realidade… (Reprodução)

Em 1991, faltando um ano para o primeiro voo, o projeto do Novi Avion foi cancelado devido aos custos e ao início da Guerra dos Bálcãs, que minou completamente qualquer chance de produção. O país se fragmentou e da mesma forma o sonho de um caça nacional iugoslavo.

MBB Lampyridae

Na mesma época, mas em outro país da Europa, nesse caso a Ocidental, um extravagante projeto de caça previa uma aeronave completamente furtiva. Esse avião era o MBB (Messerschmitt-Bölkow-Blohm) Lampyridae (Vagalume em latim).

(Reprodução)
O Lampyridae foi um dos primeiros projetos de aviões stealth da indústria aeronáutica (Reprodução)

Era para ser um caça de médio alcance, atendendo os requisitos operacionais da Luftwaffe (Força Aérea da Alemanha Federal) nos anos 80. O projeto começou em 1981 e previa o uso de mísseis para abater o inimigo sem entrar em “dog fight” (combate próximo), pois não era tão manobrável nessa condição.

Com baixíssima assinatura radar, o MBB Lampyridae utilizou conceitos que seriam revelados anos depois no F-117 Nighthawk dos EUA. Entretanto, era menor e destinado à interceptação e não ataque em terra, como no caso do americano.

(Reprodução)
O formato do avião alemão era desenhado para “refletir” as sinais de radar (Reprodução)

O projeto ia bem até que os alemães resolveram mostrá-lo aos americanos em 1987. O Lampyridae chamou a atenção de Washington, pois tinha vetorização de empuxo e o chamado “super cruise”, que é a capacidade de voar supersônico sem pós-combustão. Pouco depois foi cancelado, por atribuída pressão dos EUA… Parte de seu design foi usado no Mako, da EADS.

ALR Piranha

Descendo um pouco mais ao sul, na ocasião, a Suíça desenvolvia um novo avião de combate, que seria um caça supersônico monomotor batizado de ALR Piranha. O jato chamou atenção por ter originado uma série de variantes, mas apenas um exemplar em escala e radiocontrolado, efetivamente decolou.

(Reprodução)
O ALR Piranha era projetado para ser simples e de fácil operação (Reprodução)

A ALR é uma divisão de desenvolvimento de projetos aerospaciais da força aérea local e tocou o projeto do Piranha com ajuda do Instituto Federal de Tecnologia da Suíça. Em configuração delta com canards, o caça europeu tinha porte de Saab Gripen.

Com tamanho original de 11,57 metros e outros 7,62 de envergadura, o ALR Piranha chegava a 10.000 kg de peso máximo de decolagem, equipado com um turbofan Rolls-Royce Turbomeca Adour. Entretanto, durante o desenvolvido, surgiram variantes e duas delas eram bimotores (Snecma no Piranha 4 e Garret no Piranha 5).

A fabricante testou uma versão reduzida do Piranha controlada por rádio (Reprodução)
A fabricante testou somente uma versão reduzida do Piranha controlada por rádio (Reprodução)

O ALR Piranha teve duas variantes com tamanhos de asas diferentes do original (Piranha 2D 1 e 2), bem como um monomotor menor, o Piranha 6. Também houve um Piranha 1 subsônico e o Piranha 2 supersônico. No final dos anos 80, o governo suíço perdeu o interesse e o jato foi abandonado.

Veja mais: Conheça os jatos de combate que voaram com a FAB

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