“Desculpe, não sabíamos que era invisível”: como um antigo míssil soviético abateu um F-117 dos EUA

Bombardeiro projetado para desviar ondas de radar foi detectado e derrubado durante a Guerra do Kosovo
Lockheed Martin F-117A Night Hawk
“Invisível” aos radares, o F-117 realizava bombardeiros sem ser detectado (USAF)
O F-117 em ação: primeiro caça stealth teria participado de ataque na Síria em 2017 (USAF)

Em 1999, um moderno avião furtivo Lockheed F-117 Nighthawk (o modelo mais avançado da Força Aérea dos EUA no final da década de 1990) foi abatido sobre a antiga Iugoslávia (atual Sérvia) com um míssil e sistemas de radar soviéticos considerados obsoletos. Como isso aconteceu?

A Otan (Organização do Tratado do Atlântico Norte) entrou em confronto com a Iugoslávia em 1999 para dar suporte ao grupo rebelde albanês do Kosovo, o Exército de Libertação de Kosovo, que procurava libertar Belgrado desta região.

Um dos aviões que realizava operações sobre a região era o F-117, um modelo que havia ganhado a reputação de “invisibilidade” depois dos bombardeios bem sucedidos durante a Guerra do Golfo em 1991.

A história dessa máquina poderosa esteve imaculada até a noite de 27 de março de 1999, quando o F-117A Vega 31 pilotado pelo tenente-coronel Darrel P. Zelko voltava para a base de Aviano (Itália), após realizar uma missão de bombardeio perto da atual capital da Sérvia. Sua aeronave foi atingida e derrubada próxima à aldeia de Budanovci por um míssil S-125 Neva M, um sistema antiaéreo introduzido em combate na Guerra do Vietnã nos anos 1960. O projétil foi disparado depois de a aeronave americana ter sido identificada por um radar soviético P-18 com quase trinta anos. A ordem partiu de Zoltán Dani, comandante da 3ª bateria da 250ª brigada de mísseis do exército iugoslavo.

Sistema de defesa aérea S-125 Neva, da 250ª brigada de mísseis do exército iugoslavo (Srdan Popovic)

Mas como isso aconteceu?

Segundo as forças aliadas, os iugoslavos conseguiram detectar a aeronave operando suas unidades de radar em frequências incomumente baixas, o que tornou o alvo visível.

Os iugoslavos, por sua vez, afirmaram que os operadores de defesa aérea de Belgrado perceberam que podiam detectar aeronaves invisíveis usando radares soviéticos ligeiramente modificados. Esses equipamentos eram capazes de detectar aviões furtivos, em uma faixa de distância relativamente pequena, quando a aeronave abria as portas do compartimento para lançar as bombas.

Pioneiro: o F-117 foi desenvolvido em segredo na década de 1970 na Área 51 (USAF)
Pioneiro: o F-117 foi desenvolvido em segredo na década de 1970 na Área 51 (USAF)

Além disso, os iugoslavos monitoraram as comunicações de rádio VHF e UHF das forças aliadas (quase sem criptografia) e também foram capazes de interceptar o sistema ATO (Air Tasking Order), que permitiu localizar baterias de defesa em posições perto dos alvos que a Otan iria bombardear.

Outro fato que, sem dúvida, ajudou o bombardeiro norte-americano a morder a iscar foi que os aviões de guerra eletrônica EA-6B Prowler, que costumavam apoiá-los, interferindo nos radares inimigos, não puderam decolar naquela noite de sua base na Itália, devido ao mau tempo. Zoltán afirmou que recebeu esta informação graças a espiões iugoslavos que registravam os movimentos de aviões da Aliança em seus aeródromos. Era a noite ideal para caçar.

Radar soviético P-18: equipamento modificado conseguiu detectar o avião “invisível” dos EUA (Rayshade)

Fator humano

Zoltán Dani era um comandante bastante motivado que, como explica o The National Interest, estudou minuciosamente as primeiras táticas ocidentais de supressão de defesa aérea. Ao contrário da posição estática adotada pelos sistemas de defesa antiaéreo (SAM) iraquianos e sírios no Oriente Médio, ele permitia que suas equipes ativassem seu radar por não mais de vinte segundos, após o qual recebiam ordem para recuar, embora não tivessem aberto fogo.

O S-125M não é considerado um sistema SAM móvel, mas Zoltan fez com que sua motivada equipe de artilharia fosse capaz de implantar as armas em apenas 90 minutos (tempo padrão exigido era de 150 minutos), um procedimento facilitado ao reduzir pela metade o número de mísseis nas baterias. Enquanto os lançadores se moviam de um lugar para outro, Dani também criou postos fictícios e radares falsos, tirados de antigos caças MiG para desviar a atenção da Otan.

Zoltan Dani, comandante da terceira bateria da 250ª brigada de mísseis do Exército da Iugoslávia (Divulgação)

Graças a essas iscas e movimento constante, a unidade de Zoltán não perdeu uma única bateria de SAM, embora aviões da Otan tenham chegado a disparar 23 mísseis anti-radar HARM contra eles.

O que aconteceu com o piloto e o avião?

Darrel P. Zelko sobreviveu, ejetando-se em um paraquedas. Na sequência, foi resgatado pela Força Aérea dos EUA; os restos da aeronave, que deveriam ter sido bombardeados para impedir a sua recuperação pelos inimigos, não puderam ser destruídos devido à rápida aparição dos meios de comunicação no local do impacto.

Os sérvios forneceram aos técnicos russos o material coletado e levaram partes do avião furtivo para a Rússia, comprometendo, assim, 25 anos de pesquisa relacionada a tecnologia stealth nos Estados Unidos. Várias partes da aeronave, como a cabine, permanecem no Museu da Aviação de Belgrado, perto do aeroporto Nikola Tesla.

O canopi do F-117 abatido na guerra do Kosovo está exposto no museu de aviação de Belgrado (Petar Milosevic)

Que fim levou Zoltán Dani?

A unidade de Dani informou pouco depois, em 2 de maio, o abate do segundo avião destruído pelas forças iugoslavas durante o conflito: um F-16 americano.

Depois de se aposentar da vida militar, Zoltán Dani passou a trabalhar como padeiro em sua cidade natal, Skorenovac.

Fonte: Russia Beyond

Veja mais: Primeira aeronave fabricada pela Embraer foi um planador

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