O vice-presidente do Brasil, Hamilton Mourão, disse durante videoconferência nesta terça-feira, 27, que a Embraer deveria considerar a China como parceira após a Boeing cancelar o acordo de joint venture com a divisão de aviação comercial da empresa brasileira.
“Nós temos o produto e eles têm a necessidade. Nós temos a tecnologia…É um casamento inevitável”, afirmou Mourão.
Em meio à polarização política dos dias atuais, com debates ideológicos e a crise do coronavírus, a declaração do vice-presidente pode soar na contramão do que pensa a liderança do governo atual, sobretudo pelo histórico recente de críticas à China em meio a pandemia.
A parceria com a Boeing era considerada vital para o futuro da Embraer. O poder de negociação da empresa norte-americana estabelecido no mundo todo daria maior projeção aos aviões projetados no Brasil, além de oferecer vigor financeiro para bancar novos projetos, como a proposta de um turboélice de nova geração que vinha sugerida por executivos da companhia. Do outro lado, a fabricante dos EUA teria produtos para competir no setor de aviação regional, em especial contra Airbus A220 (ex-Bombardier CSeries). O acordo também incluía uma segunda joint venture para comercialização do jato militar C-390 Millennium.
Agora nada disso vai acontecer. Em conferência com investidores, o CEO da Embraer, Francisco Gomes Neto, descartou a chance de retomar a negociação com a Boeing, mesmo que sob termos diferentes. O executivo ainda disse que a companhia está aberta para novas parcerias, “mas precisamos de tempo para decidir o próximo passo estratégico.”
Quer ser meu parceiro?
Em um mercado dominado pela Boeing e Airbus, quem mais poderia se unir a Embraer? Empresas da Europa, como a francesa Dassault ou o que restou da alemã Dornier, não teriam dinheiro neste momento ou interesse em parcerias. No Japão, a Mitsubishi Aircraft assumiu recentemente a série CRJ da Bombardier e ainda quebra a cabeça para concluir sua própria linha de jatos regionais. Outra opção seria negociar com os russos, mas eles também estão ocupados demais (e gastando demais) com o jato Irkut MC-21 e o projeto de um novo widebody.
Com todo esse embaraço e incertezas no setor aéreo, as únicas fabricantes que terão fôlego para novos investimentos após a crise do coronavírus são aquelas com proteção estatal. Nesse caso, desconsiderando as já atarefadas empresas russas, sobram apenas nomes da China.
A chance de uma parceria da Embraer com empresas chinesas ainda é pura especulação. Se confirmada, certamente seria recebida pelos brasileiros como um pandemônio. Para a companhia brasileira, uma negociação nesse sentido seria como andar em um chão de brasas, mas tomando um banho de bilhões de dólares.
A China tem hoje o segundo maior PIB do mundo, atrás apenas dos EUA. Com a ajuda do estado, a indústria aeronáutica chinesa vem dando importantes passos nos últimos anos, com grandes investidas nos setores militar e comercial.
A “Boeing da China” é a COMAC (China Commercial Aircraft), empresa que está desenvolvendo o jato C919, uma aeronave para concorrer com os tradicionais 737 e A320. É um projeto ousado e importante para abastecer o enorme mercado doméstico chinês, além de representar um grande avanço tecnológico para o país. Mas para isso o avião precisa ser finalizado, algo que os chineses ainda não conseguiram.
Além da ousadia, o C919 também é notório pelos atrasos em seu lançamento, programado originalmente para 2014. Há 18 anos no mercado, a COMAC ainda está “aprendendo” a construir aviões comerciais. Foi assim com todas as grandes fabricantes. No entanto, as lições poderiam ser aceleradas com a ajuda de um parceiro acostumado aos desafios da aviação, algo que a Embraer começou em 1969.
O expertise dos engenheiros da Embraer era considerado um dos maiores atrativos na negociação da joint venture com a Boeing e poderiam figurar em novos projetos da empresa norte-americanas. Imagine então a ajuda que eles poderiam dar aos chineses?
Além de colaborar em projetos chineses, a Embraer também teria presença garantida no mercado de aviação chinês, que nos próximos anos tende a ser o maior do mundo. Isso, contudo, poderia transferir a produção das aeronaves para a China, onde tudo é mais barato e o que manda na aviação é o dinheiro, custe o que custar.
Negócios da área militar
Da mesma forma como a Boeing queria participar do programa C-390 Millennium da Embraer, o mesmo poderia acontecer com a AVIC, outra fabricante aeronáutica controlada pelo governo chinês, especializada em aviação militar e que já foi parceira da empresa brasileira no passado.
Estabelecida em 1993, embora suas origens remontem a década de 1950, a AVIC tem um vasto portfólio de aeronaves militares, incluindo variados caças, de modelos convencionais a jatos stealth de última geração, bombardeiros, aviões de carga e helicópteros de transporte e ataque. A empresa é hoje o principal fornecedor de equipamentos aéreos para as forças armadas chinesas.
Um dos poucos produtos que faltam no menu da AVIC é justamente a opção de cargueiro médio a jato, como o C-390. A empresa atua nesse segmento com o turboélice Y-9 e o Y-20, o maior avião produzido na China.
Negociações sobre o Super Tucano seriam mais complicadas, uma vez que a Embraer já tem um acordo com a Sierra Nevada Corporation para produzir o avião nos EUA e envolver a AVIC soaria estranho, embora a última palavra acaba sendo a de quem paga mais.
Na atual situação, juntando os cacos da crise, a Embraer não deve negociar tão cedo um novo acordo de parceria envolvendo algumas de suas divisões. Passada a crise, essa possibilidade pode ser discutida, mas a conclusão de qualquer negócio, como foi o acordo com a Boeing, precisa ser avalizada pelo governo brasileiro, que detém as ações “Golden Share” que dão poder de veto a decisões estratégicas na empresa.
A pergunta que fica: se a Embraer receber uma proposta sedutora da China e que garanta sua sobrevivência e sucesso no futuro, a negociação deveria ser autorizada pelo governo?
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“Generau julga doce o sujo dinheiro chinês. Pobre presidente, até o vice Pobre de nós também
Se for bom para a Embraer e o Brasil, qualquer parceria será boa, sem essa de impedimentos de cunho ideológicos. A mente fechada de algumas pessoas não pode prejudicar o nosso desenvolvimento econômico!
O texto não respondeu o título, pairou em hipóteses até terminar com outra interrogativa.
De resto, a China é um país com muitos prós em relação à economia global e contras culturalmente: os asiáticos têm um gosto bastante peculiar para tudo.
Mas Ralfo, eu penso que não se trata do Brasil “casar” com a China e nem estreitar laços, uma vez que a questão ideológica e diametralmente oposta em relação pais China e ao nosso Presidente, é fato! Nesse caso, esse assunto político, não é tema da grande questão aqui. A questão é de sobrevivência. Sem esta “parceria” o que será do resto da Empresa? A aviação comercial pode levar os demais segmentos pro buraco? Tem outra alternativa? (eu acho que tem). Mas ambas alternativas significam bilhões em dinheiro para que os outros segmentos da empresa não só sobrevivam mas cresçam! Lógico que, como questionei em outro comentário, será verdade que a Embraer pra sobreviver na aviação comercial precisa mesmo de fusão ou ser vendida essa parte? É outra questão. Se a China entrar na jogada como era com a Boeing (vamos considerar que isso não implicará no Brasil virar amiguinho da China, pois acho que isso não vai acontecer), agora já entrarão bilhões de dólares e no futuro outros bilhões com o acesso dos aviões da Embraer ao mercado Chinês. Se no futuro a Embraer sair da jogada definitivamente, que seja! Hoje a China compra a carne brasileira e só! Se os negócios com a China se tornarem porta para outros tipos de influências, aí é assunto pra outra matéria.