Estação Espacial Internacional pode encerrar carreira recebendo turistas

Em órbita há quase 20 anos e com um custo anual de US$ 6 bilhões, ISS tem vida útil estimada em mais 10 anos
(NASA)
Os primeiros módulos da ISS comeram a funcionar em novembro de 2000 (NASA)

Um dos maiores feitos na história da humanidade, a Estação Espacial Internacional (ISS) entrou provavelmente na sua última década de operações. Em órbita desde novembro de 2000, a magnifica construção do tamanho de um campo de futebol é também um objeto sensível com custos de manutenção exorbitantes. Não só isso, também tem um prazo de validade.

O consórcio internacional que administra a estação vem discutindo nos últimos meses qual será o destino da ISS nos próximos anos. Segundo os termos do acordo, a construção no espaço deve continuar recebendo astronautas pelo menos até 2024 e os laboratórios podem continuar ligados por mais dois anos.

Esgotado esse tempo, a estação deve ser desmontada e lançada por partes de volta para a Terra, acabando desintegrada pelo caminho de reentrada na atmosfera. O destino final de cada módulo é responsabilidade do país que o construiu. A ISS tem cinco módulos dos EUA, cinco da Rússia, dois do Japão e dois da Agência Espacial Europeia (ESA).

Um grupo de senadores dos EUA propôs recentemente estender as operações da ISS até 2030 e abri-la para atividades comerciais. A ideia dos governantes é criar uma “economia espacial” na estação e assim sustentar suas atividades em órbita no período final de operações. O custo anual para manter a construção no espaço gira em torno de US$ 6 bilhões.

“A extensão (das operações) da estação está sendo discutida entre a NASA e os parceiros internacionais”, disse o porta-voz da NASA, Rob Navias, ao site Space.com. “Nenhuma decisão formal sobre uma data de prorrogação foi acordada, mas está em discussão.”

A Nanoracks, uma empresa do Texas que ajuda outras companhias a desenvolver produtos para a ISS, já está pensando no fim da vida útil da estação espacial. Mas a história mostra que é difícil saber quando isso vai acontecer.

Nave Soyuz acoplada à ISS (NASA)

“Estou nesse cargo há oito anos; quando comecei, em 2011, a estação espacial deveria ser aposentada em 2015”, disse Richard Pournelle, vice-presidente sênior de desenvolvimento de negócios da Nanoracks, na última conferência da SpaceCom em Houston, em novembro.

“Agora, o prazo está em torno de 2024”, acrescentou Pournelle. “Algumas pessoas dizem 2028. Algumas pessoas dizem 2030 ou mais. Vale a pena pensar sobre essa questão. Não será um encontro difícil e rápido. Não acordaremos uma manhã e tudo acabará. Será algum tipo de período de transição e acho que estamos começando a entrar no período de transição.”

Pournelle apontou para três possíveis sinais de que esse período de transição está chegando e pode atrair atividades comerciais. O primeiro é um estudo recente de comercialização de espaço em órbita terrestre baixa, liderado pela Nanoracks e com a participação de mais 12 empresas. Esse relatório, lançado em julho de 2019, sugere a transição gradual do ISS para um sistema “avançado” que reutilizaria os estágios da estação para criar plataformas comerciais. Essas módulos seriam operados por robôs e poderiam operar separados ou unidos.

A segundo sinal de mudança, disse Pournelle, é o recente anúncio da NASA de que permitiria uma pequena alocação para cargas comerciais na estação espacial. Em junho, uma nova diretiva da agência espacial dos EUA prometeu “permitir a fabricação e a produção comercial” no setor espacial. Pournelle disse que isso é importante porque abre a possibilidade de empreendimentos comerciais na ISS, indo além de operações puramente científicas.

O terceiro sinal, disse Pournelle, tem a ver com o maior número de missões comerciais para o espaço. Ao mesmo tempo em que a NASA lançou sua nova diretiva, a agência abriu uma solicitação para que companhias do setor privado anexassem seus próprios módulos à ISS. Com o tempo, várias empresas teriam a chance de usar esse novo porto comercial da estação espacial e, possivelmente, levar seus próprios astronautas para a instalação.

A ISS já recebeu 236 astronautas de 18 nacionalidades (NASA)

Outras empresas, incluindo a Sierra Nevada e a Northrop Grumman, também pensam em construir módulos espaciais com finalidades comerciais. Representantes de ambas as empresas se juntaram a Pournelle no painel da SpaceCom para falar sobre as possibilidades desses futuros habitats espaciais quando o mercado estiver pronto para eles.

“O custo do lançamento continua sendo o fator de custo mais significativo que dificulta os modelos de negócios para o espaço comercial”, alertou Derek Hodgins, diretor de desenvolvimento de negócios de programas avançados da Northrop Grumman. Sua empresa concluiu recentemente testes em solo para um habitat para expedições em espaço profundo, em parceria com a NASA.

Hodgins sugeriu um novo redirecionamento dos módulos espaciais existentes e criar sistemas de lançamento capazes de executar várias missões ao mesmo tempo, para “otimizar o retorno do investimento” e reduzir o número de viagens ao espaço para colocar as atividades comerciais em funcionamento.

O principal engenheiro de sistemas da Sierra Nevada, Jeff Valania, disse que sua empresa está trabalhando no desenvolvimento de um habitat multiuso que seria “ideal para atividades comerciais em baixa órbita terrestre”, como turismo, pesquisa e desenvolvimento de produtos.

“Ele pode aumentar o volume habitável existente da ISS ou servir como o principal módulo habitável de uma plataforma comercial autônoma”, acrescentou Valania. Assim como Hodgins, ele pediu um “espaço comercial compartilhado” que permitisse aos prestadores oferecer serviços e produtos diferentes.

O Starship é como uma evolução dos antigos Ônibus Espaciais da NASA, mas projetado para ir mais longe e levar mais carga (SpaceX)
A SpaceX está desenvolvendo o Starship, uma espécie de Ônibus Espacial de nova geração (SpaceX)

A Rússia já declarou que pretende manter seus módulos em órbita, mesmo separados dos demais. Caso realmente desistam de sua participação na ISS, EUA, Japão e Europa devem enviar suas partes de volta para a Terra, das quais sobrarão apenas detritos incendiados que serão preservados em museus para a posteridade.

Hotel espacial

A Estação Espacial Internacional tem capacidade para receber até nove astronautas, embora a ocupação típica seja de três a no máximo seis pessoas. Em quase 20 anos de operações, a ISS recebeu um total de 236 astronautas de 18 nacionalidades em 95 expedições realizadas com os antigos Ônibus Espaciais da NASA e as naves Soyuz da Rússia.

Hoje ministro de Ciência e Tecnologia do Brasil, Marcos Pontes viajou para a ISS em 30 de março de 2006 e retornou nove dias depois. Ele até hoje o único cidadão brasileiro e sul-americano (e ainda lusofônico) que foi ao espaço. Pontes foi um dos três tripulantes da 13° expedição enviada para a estação, lançada por uma Soyuz.

Marcos Pontes foi um dos membros da 13° expedição à ISS com o cosmonauta Pavel Vinogradov e o astronauta dos EUA, Jeffrey N. Williams (NASA)

A abertura da ISS para atividades comerciais pode enfim abrir o caminho para o turismo espacial, ainda que seja aproveitando os últimos anos de operações da estação. Mas como ocorreu em outros anos, a vida útil da construção vem sendo flexível.

Está nova década que começa pode ficar marcada nos livros de história no futuro como a fase onde começou o turismo espacial. Diferentes empresas prometem lançar missões comerciais nos próximos anos, indo desde voos orbitais como a experiência oferecida pela Virgin Galactic, até viagens mais longas para a Lua e Marte, pretendidas pela Blue Origin do bilionário Jeff Bezos e a SpaceX, de Elon Musk.

Nota do editor: O Brasil entrou para o consórcio da ISS em 1997, mas acabou excluído do programa em 2007 depois de não entregar componentes que deveriam ser enviado para a estação.

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