Não se pode dizer que se trata de um projeto elegante, mas o Pucará é, sem dúvida, o avião mais importante já construído na Argentina – em que pese nossos vizinhos terem um passado brilhante na construção aeronáutica incluindo os primeiros jatos do continente.
Fabricado pela FMA (Fabrica Militar de Aviones), o IA 58 surgiu na mesma época em que o Brasil se esforçava para tirar do papel o Bandeirante. Mas ao contrário do bimotor de transporte que deu origem à Embraer, o turbo-hélice argentino tinha como missão ser uma aeronave leve de ataque cujo primeiro protótipo AX-2 voou há 50 anos (em 20 de agosto de 1969).
Famoso após participar da Guerra das Malvinas quando foi amplamente usado contra as forças britânicas, o Pucará (algo como fortaleza no idioma quechua) está próximo de encerrar sua carreira na Força Aérea Argentina. Nesta quarta-feira (28), o Comodoro Darío Quiroga, chefe da 3ª Brigada Aérea, confirmou que o turbo-hélice terá uma cerimônia de despedida no dia 4 de outubro na base aérea de Reconquista, no norte do país.
Será o fim de uma era que durou pouco mais de 44 anos quando o primeiro IA 58 entrou em operação, em maio de 1975, e meses depois já tinha seu batismo de fogo ao ser usado em ataques contra guerrilhas.
Mas foi na Guerra das Malvinas (Falklands) que os Pucará tornaram-se mundialmente conhecidos. Em 1982, a FMA já havia entregue cerca de 60 aviões e sua versatilidade e capacidade de operar em pistas despreparadas o tornou uma arma valiosa no conflito contra a Inglaterra.
Um dos aviões obteve a única vitória argentina confirmada no ar ao abater um helicóptero Scout dos fuzileiros britânicos. No fim do conflito, vencido pelo Reino Unido, nada menos que 11 aeronaves foram capturadas, parte delas enviada para o país e exposta até hoje em museus.
Solução simples e eficiente
O Pucará começou a se materializar logo após os militares tomarem o poder na Argentina, em 1966. Com vários grupos de guerrilheiros espalhados pelo país, o governo decidiu desenvolver uma aeronave capaz de realizar missões de contra-insurgência e para isso requereu à então Dirección Nacional de Fabricación e Investigación Aeronáutica (DINFIA) seu projeto.
Na época era desenvolvido o turbo-hélice de transporte IA 50 Guarani e a mesma equipe acabou responsável pelo novo avião que optou por uma configuração de asa baixa sem enflechamento e com diedro positivo nas suas pontas.
A cauda em T e os dois assentos em tandem completavam o projeto que contava com quatro metralhadoras de 7.62 mm da FN Browning nas laterais da fuselagem e dois canhões Hispano Suiza de 20 mm na parte inferior, além de cabides de armas nas asas. O Pucará contava ainda com assentos ejetáveis zero-zero fornecidos pela inglesa Martin-Baker.
Embora tenha voado com motores Garrett no primeiro protótipo, a FMA acabou adotando os turbo-hélices franceses Astazou fornecidos pela Turbomeca. Seu desempenho era respeitável: velocidade de cruzeiro de 430 km/h, raio de combate de 350 km, teto de serviço de 10 mil metros e capacidade de transportar mais de 1,6 tonelada de armamentos.
A Argentina vislumbrou a exportação do Pucará, mas apenas o Uruguai, a Colômbia e o Sri Lanka operaram o avião. O Brasil chegou a estudar a compra de 30 unidades como parte do projeto SIVAM, de vigilância na Amazônia, mas acabou optando pelo Super Tucano.
Versão de um lugar
Durante essas quatro décadas, foram pensadas várias formas de aprimorar a aeronave, incluindo até versões a jato e pressurizadas, mas no fim quase nenhuma iniciativa chegou ir muito longe. Uma das que mais tiveram chances de tornar-se realidade foi a variante IA 58C, com um assento. Desenvolvida após as lições aprendidas com as Malvinas, ela trazia um canhão mais potente, o DEFA de 30 mm, capacidade para transportar mísseis ar-ar e antitanque e até mesmo aviônicos de guerra eletrônica.
Um protótipo voou em 1985, mas a Força Aérea acabou desistindo de receber 15 unidades por falta de recursos. Há poucos anos, o Pucará recebeu novos aviônicos em uma leve modernização tocada pela FMA.
Apesar da boa imagem, o turbo-hélice deixou ser usado pela Colômbia em 1998 e pelo Uruguai em 2017. Agora é a vez derradeira da Argentina, colocando um ponto final em seu histórico operacional. Segundo Quiroga, os Pucarás já atingiram uma quantidade de horas de voo que limita seu uso, sobretudo em relação aos motores e aos assentos ejetáveis.
Dos 110 aviões produzidos, restariam pouco mais de 20 Pucará ativos na Força Aérea Argentina e que certamente serão merecidamente preservados nos museus do país, espera-se.
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Excelente reportagem!
O Brasil bem que poderia adquirir um desses aviões ou trocar por alguma aeronave estocada. seria bacana ter um Pucará exposto num museu aeronautico brasileiro.