Para os que acham que o drama vivido pela Boeing no programa 737 Max é apenas uma infeliz coincidência, vale conhecer a atribulada carreira do KC-46A, variante de resbastecimento aéreo do jato comercial 767 e que foi escolhida pela USAF para substituir os velhos e confiáveis KC-135.
Após uma longa batalha com a Airbus e General Dynamics pelo contrato com a Força Aérea dos EUA, a fabricante mergulhou em um pesadelo sem fim com o projeto. Custos incrivelmente mais altos, atrasos e problemas têm marcado o programa que, mesmo após entrar em serviço no ano passado, acumula falhas graves, a mais recente delas, espantosa: o KC-46A está vazando combustível de forma inexplicada.
Sim, uma aeronave capaz de transportar quase 100 toneladas de combustível, ou seja, uma “bomba incendiária” de proporções gigantescas, voa com querosene escapando, colocando seus ocupantes no que a USAF considera uma “deficiência de categoria 1”, quando ela “pode causar morte ou ferimentos graves; pode causar perda ou grandes danos a um sistema de armas; restringe criticamente os recursos de prontidão para combate da organização que os utiliza; ou resulta em uma parada na linha de produção”.
Os vazamentos começaram a ser detectados em julho do ano passado, mas nesta semana passaram a ser considerados graves pela Força Aérea, que emitiu um comunicado em que afirma estar trabalhando junto à Boeing “para determinar a causa principal e implementar ações corretivas. Os responsáveis pelo programa continuam a monitorar toda a frota de KC-46 e aprimorando os testes de aceitação do sistema de combustível para identificar possíveis vazamentos na fábrica onde eles podem ser reparados antes da entrega. A Boeing está contratualmente obrigada a remediar essa deficiência sem nenhum custo adicional para o governo”.
Problemas diversos
A Boeing garantiu que o KC-46A é seguro mesmo com o vazamento já que há duas barreiras de proteção entre o combustível e a tripulação, porém, não detalhou as razões da falha até aqui.
Com cerca de três dezenas de aeronaves entregues, o KC-46A deveria ser um programa de baixa complexidade para a Boeing, afinal ela forneceu os dois aviões de reabastecimento aéreo da USAF usados até hoje, o KC-135 (baseado no Boeing 707) e o KC-10, variante do DC-10 produzida ainda nos tempos da McDonnell Douglas.
Apesar de toda essa experiência e do 767 já ser usado nessa função em outros países como o Japão, o KC-46A apresenta falhas que soam um tanto quanto improváveis como travas de contêineres e de cargas que se soltam em voo e um sistema de câmeras na lança de reabastecimento que distorce a imagem e torna a operação arriscada.
O mais notório problema do KC-46A, no entanto, é não conseguir reabastecer adequadamente o A-10 Thunderbolt, veterano avião de ataque ao solo. Como é mais lento que outros jatos, sobretudo em grande altitude, ele não possui potência suficiente para encaixar seu receptáculo de combustível no conector e a desconexão também sido feita de forma imprópria, segundo a USAF.
Cercada de problemas de todos os tipos e pressionada pelo seu endividamento frente à crise do coronavírus, a Boeing terá de resolver as deficiências do KC-46A enquanto conclui a entrega das 67 unidades encomendadas. E tendo de arcar com o cada vez maior prejuízo com o programa. Pelo jeito, não é só combustível que anda vazando na fabricante…
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