No início da década de 1970, bastava pronunciar a sigla “MiG-25” diante dos generais da OTAN para causar-lhes pânico. Haviam rumores a respeito das capacidades de um novo caça soviético e elas eram simplesmente fora do comum.
Projetado pela Mikoyan-Gurevich (MiG), o MiG-25 era considerado um super caça “puro”, mais rápido que qualquer outro avião então operacional no mundo naquele tempo. A nova aeronave era tão assustadora que os Estados Unidos correram para desenvolver o F-15 Eagle, que deveria ser o adversário capaz de deter o “Foxbat”, como foi chamado na denominação da OTAN.
Em 1976, o medo em relação ao Foxbat estava no auge quando o tenente Viktor Ivanovich Belenko desertou com um MiG-25 de Sajarovka (atual Vladivostok) para Hokkaido, no Japão.. Especialistas ocidentais não perderam tempo e correram para analisar o avião. No entanto, o pavor logo virou desprezo. Já o piloto soviético foi morar nos EUA, em North Dakota, onde vive até hoje com sua esposa e dois filhos.
O tão temido caça soviético era fabricado quase que inteiramente em aço, material que os projetistas do Ocidente haviam deixado de usar em aeronaves de alta performance, já vários anos antes. Nessa mesma época, caças americanos eram construídos com alumínio e titânio – mais caros.
Os especialistas enviados ao Japão descobriram que o MiG-25 podia voar a 3.400 km/h, mas só podia manter essa velocidade por poucos minutos. Os dois enormes turborreatores do caça, modelos Tumanskii RD-31, eram potentes (cada um gerava 11 toneladas de empuxo), mas consumiam tanto combustível que a autonomia do caça ficava drasticamente comprometida. A parte eletrônica da aeronave também deixava a desejar e em alguns aspectos já era totalmente obsoleta: o radar ainda utilizava válvulas termo-iônicas, uma tecnologia da Segunda Guerra Mundial, ao passo que os caças americanos já começavam a entrar na era digital.
Bruto
Contudo, a história já mostrou diversas vezes que as críticas de especialistas norte-americanos podem ser um tanto precipitadas ou superficiais. O radar do MiG-25 era primitivo, mas tinha potência suficiente para se defender das interferências das contramedidas eletrônicas (sinais que podem enganar mísseis e radares) do Ocidente. Além disso, o cockpit era construído com materiais relativamente simples. Mas outras partes do avião nem tanto: o porão dos motores contava com um revestimento de 5 kg de prata com uma espessura de 30 mícrons, que isolava termicamente o restante da célula e assim obter melhores resultados de aceleração (e também para não “fritar” o interior do avião…).
Antes do surgimento do MiG-25, os soviéticos ainda não haviam voado a Mach 3 (três vezes a velocidade do som) com jatos convencionais. E voar nesse ritmo pode apresentar problemas muito perigosos. Para obter um nível aceitável de manobrabilidade sem sacrificar velocidade ou altitude, as principais “armas” do caça, os projetistas escolheram uma asa grande e fina, de enflechamento positivo e complexos difusores de admissão e deriva dupla, com ligeira inclinação para fora.
Essa era a resposta da antiga União Soviética para a ameaça do supercaça que os EUA preparavam, o Lockheed A-11 (que posteriormente foi abandonado e transformado no avião-espião SR-71 Blackbird, o avião mais rápido do mundo já produzido em série). O desenvolvimento do MiG-25 começou no final da década de 1950, por iniciativa da própria MiG, e a partir de 1962 passou a ter suporte oficial do governo soviético. Já o primeiro voo do caça aconteceu no dia 6 de março de 1964 e nesse mesmo ano sua produção foi iniciada.
Para ter uma autonomia satisfatória, quase 70% do volume do MiG-25 são tanques de combustível, que conferiam a aeronave uma capacidade interna de 17.660 litros. A fabricante também teve de desenvolver avançados sistemas de refrigeração do cockpit. Quando atingia sua incrível velocidade máxima, o atrito com o ar fazia a parte externa do caça ficar tão quente que não podia ser tocada com as mãos.
As primeiras séries do MiG-25 eram armadas com um canhão de 23 mm e mísseis de curto alcance. Mas até o final da década de 1960, o modelo passou a utilizar os novíssimos mísseis de médio e longo alcance soviéticos, como o R-40, que podia abater aviões a mais de 80 km de distância.
Espião imbatível
Apesar de ter sido originalmente projetado como interceptador, o velocíssimo MiG-25 tinha um claro potencial para atuar como avião de reconhecimento e um protótipo deste tipo voo seis meses antes mesmo do caça. Chamado MiG-25R, a versão de espionagem levava cinco câmaras fotográficas no nariz, uma vertical e quatro oblíquas, cobrindo uma frente de 90 km de largura durante o voo.
Ainda antes de entrar em operação, uma unidade experimental com quatro MiG-25R, comandados por aviadores soviéticos, foi destacada para o Egito para efetuar missões sobre Israel. Em muitas dessas ocasiões, as forças israelenses lançaram mísseis contra os MiG-25 espiões, mas os aviões voavam tão rápidos e altos que os artefatos não podiam alcançá-los.
MiG-31
Ao mesmo tempo em que os primeiro MiG-25 entravam em operação com a força aérea soviética, a MiG já trabalhava em uma versão melhorada de seu supercaça. Em 1975, as forças armadas da URSS começaram a receber os primeiros MiG-31 – “Foxhound” da denominação da OTAN.
Esse avião contava com motores mais avançados (mas não mais potentes), estrutura reforçada e ampliada para levar mais combustível e um tripulante adicional, no caso o operador de sistemas e mais armas. Diversos componentes de aço foram substituídos por novos construídos em alumínio e titânio, mais leves (e mais caros), e o radar passou a ser de varredura eletrônica associados a alguns dos mais avançados sensores infravermelho de longo alcance do mundo – o modelo usado caça russo pode detectar o calor de outro avião a mais de 90 km de distância. E nem é tão caro: cada caça é avaliado em cerca de US$ 60 milhões (mais em “conta” que o preço do Gripen NG, avaliado em US$ 68 milhões).
Quando estrou, o MiG-31 contava com um radar único em sua categoria. Podia seguir até 10 alvos simultaneamente e atacar quatro deles apenas apertando um botão. Não só isso, o novo radar com infravermelho podia detectar aeronaves voando a apenas 60 metros do solo ou a mais de 20 mil metros altitude. Atualmente, com a Força Aérea da Rússia, atua principalmente em missões de reconhecimento e caça/interceptador.
A principal arma do MiG-31 é o míssil de longo alcance R-33, guiado por radar e capaz de abater aeronaves a mais de 300 km de distância. O jato pode levar quatro desses artefatos. Essa carga permite ao caça voar por cerca de 1.400 km e, diferentemente do MiG-25, o Foxhoud pode ser reabastecido em voo, a partir de uma sonda especial.
Troféus do MiG-25
A URSS nunca utilizou o MiG-25 em combate, mas seus clientes trataram de fazê-lo. O Foxbat já esteve envolvido em diversos incidentes e duras guerras no Oriente Médio. A Força Aérea do Iraque foi a que mais provou o modelo, em conflitos contra o Irã e Estados Unidos.
Durante a Guerra Irã-Iraque, entre 1980 e 1988, MiG-25 iraquianos foram utilizados principalmente em missões de reconhecimento. Mas houve momentos que os aparelhos foram destacados para operações de caça. Durante o conflito contra o Irã, os Foxhoud de Saddan Hussein derrubaram mais de uma dezena de aeronaves militares iranianas, entre elas caças F-4 Phantom e F-5 Tiger, e cargueiros C-130 Hércules.
O conflito, que não teve vencedor, custou ao Iraque seis MiG-25 abatidos por caças F-14 Tomcat do Irã e um pelo modesto F-5. Em um desses aviões abatidos estava o Coronel Mohammed Rayyan, o maior Ás do MiG-25, com 10 vitórias a serviço da força aérea iraquiana. O piloto não conseguiu ejetar após o impacto do míssil e morreu. E os MiG iraquianos logo voltariam ao combate.
Em agosto de 1990, Saddam Hussein ordenou a invasão do Kuwait e em poucos dias estava instalada a Guerra do Golfo. No entanto, nesse conflito o MiG-25 foi presa fácil, em especial do F-15 Eagle dos EUA, que finalmente teve a oportunidade de enfrentar o rival para o qual havia sido concebido. Logo no início no conflito, F-15 norte-americanos abateram dois Foxbat iraquianos e um terceiro foi abatido por um F-16 Falcon, também americano, após a guerra.
Em contrapartida, a única vitória aérea do Iraque durante a Guerra do Golfo, foi obtida por um MiG-25: a vítima foi um F/A-18 Hornet, da Marinha dos EUA. Já na “segunda” Guerra do Golfo, a partir de 2002, o poderoso caça soviético não foi utilizado. Em vez disso, foram enterrados. Em 2003, soldados dos EUA encontraram 10 caças “sepultados” no deserto do Iraque.
O MiG-25 também operou nas forças aéreas de Armênia, Bulgária, Belarus, Índia, Georgia, Cazaquistão, Líbia, Turcomenistão e Ucrânia.
O último usuário do MiG-25 foi a Argélia, que os desativou em 2014. Já o MiG-31 segue voando com as cores do Cazaquistão, Síria e da Rússia, que possuía mais de 150 aparelhos ativos.
Embora nunca tenha sido utilizado em combate e de ser mais “lento” que se predecessor, o MiG-31 carrega o título de avião mais rápido da atualidade, com velocidade máxima de 3.000 km/h. E o legado deve durar por mais duas décadas, pois os russos não tem inteções de desativar seus modelos tão cedo.
Veja mais: Baka, o avião-bomba kamikaze
Excelente matéria!! Apenas uma dúvida… na Seção “Troféus do MIG 25”, está escrito “Foxhound”. Não seria “Foxbat”?
Eles (25 e 31) são uns monstros! Parabéns pela matéria.
Não considero ruim o fato de usar aço inoxidável para um projeto tão extremo porque é um material refratário bem viável. Além do aço o projeto usou solda ponto que é outra ousadia para a construção aeronáutica. O principal ponto frágil no projeto é o uso do jato a turbina, com partes rotativas em tão alta velocidade. O tempo em velocidade máxima não só tragava muito combustível, mas também fazia os anéis e as palhetas fluírem, não só pela temperatura, mas também pela elevada aceleração centrípeta, este motores se mantidos por muito tempo acima de Mach 2,5 podia se danificar definitivamente.
O Mig 25 foi o interceptador criado ante a ameaça do B-70, que não passou da fase de protótipo.
Excelente a matéria. Gostaria que me indicassem uma revista sobre essas matérias e as armas das três forças do nosso Brasil.
Olá Edvaldo! Obrigado pelo comentário!
Minha revista favorita sobre aviação é a ASAS, da Creditorial. abs!
Material de primeira ,Thiago…parabéns.
Aproveito para perguntar se vc sabe alguma coisa sobre um projeto em desenvolvimento pela Russia,Índia e China sobre caça com tecnologia Sthealt. Inclusive o Brasil foi convidado para participar desse projeto por volta do ano de 2010…mas parece que não se intere$$ou.
E o Porta Aviões brasileiro…Poseidon???
Os Beriev russos decolam e aterisam a partir de aguas , inclusive do mar. Imensos desenvolvidos na guerra fria, com grande capacidade de carga. voam a 600 km/hora e não fora a desaceleração violenta poderiam atuar no transporte de pessoas para e das plataformas de petroleo