A novela para concluir a joint venture entre Boeing e Embraer pode ganhar mais um episódio nos próximos dias. O Ministério Público Federal (MPF) apresentou nessa quarta-feira (12) um recurso para que o Tribunal do Conselho de Administrativo de Defesa Econômica (Cade) analise novamente a negociação do controle da divisão comercial da fabricante brasileira para o grupo norte-americano, que havia sido aprovada sem restrições pelo órgão no último dia 27 de janeiro.
Documentos obtidos pela agência Reuters revelam que o MPF identificou “algumas omissões” na decisão tomada pela Secretaria-Geral do Cade ao avaliar como o mercado poderia ser afetado com a operação entre as fabricantes. Um dos pontos questionados é sobre o possível impacto da joint venture no setor de aviação regional, segmento de aeronaves com menos de 100 assentos.
O recurso do MPF aponta que a avaliação anterior do Cade havia considerado como mais preocupante para o caso as mudanças que envolvem a aviação comercial de 100 a 200 assentos e um recorte específico, de 100 a 150 assentos e que é o principal ramo de atuação do aviões comerciais da Embraer.
O documento ainda destaca que o Cade “tratou de aeronaves situadas além dos 150 ou 200 assentos, visando, principalmente, a indicar a considerável fatia de mercado detida pela Boeing no segmento mais amplo da aviação de grande porte” e que, “portanto, como lacuna ao desenvolvimento do argumento, a consideração do sentido oposto, isto é, o de segmento inferior a 100 assentos”, continua o texto.
“Por mais que as aeronaves identificadas como potenciais competidoras, entre Boeing e Embraer, estejam situadas na fatia entre 100 e 150 assentos, a providência descrita é importante para a completude da análise de poder de portfólio, já que a Embraer fabrica atualmente diversos tipos de aeronaves utilizadas para aviação regional, e detém, aliás, significativo nível de sucesso neste mercado”, acrescenta o documento.
O parecer da área técnica usado pelo superintendente-geral do Cade para chancelar a transação no mês passado dizia que não havia indícios de que a “operação comercial foi estruturada com o intuito de inviabilizar uma eventual concorrência futura da Embraer nos mercados de aeronaves comerciais com capacidade maior que 150 assentos ou que a operação possa ter esse efeito”. O órgão ainda ressaltou que o acordo entre as empresas poderia gerar mais competição no setor.
O MPF pede ao Cade que reavalie os impactos concorrenciais das operações em todos os potenciais mercados envolvidos e que a análise feita até o momento corre o risco de subdimensionar os efeitos da ampliação do portfólio da Boeing ao não levar em conta o segmento de aviação regional.
“A desconsideração não condiz com a apuração de uma operação de grande relevância para a autoridade antistruste, que envolve duas das três maiores fabricantes de aeronaves comerciais do mundo, conforme dados dos últimos anos, sendo que a Embraer é a primeira no segmento regional, além disto, situada em um mercado peculiar e complexo, característico por elevadas barreiras à entrada, e atualmente marcado por uma configuração de duopólio existente em âmbito mundial”, destaca o recurso apresentado pela subprocuradora-geral da República Samantha Dobrowolski.
Próximos passos
O recurso apresentado pelo Cade será distribuído a um relator, que deverá emitir um despacho dizendo se recebe a reclamação do MPF ou não. Esse processo será enviado para nova análise do Cade. Se o órgão decidir pela reavaliação da operação, o relator vai estudar o caso, produzir o voto e levá-lo a julgamento.
O pedido do MPF não tem efeito suspensivo e as fabricante podem dar continuidade à operação, mas ela não pode ser concluída até a decisão final do Cade em reavaliar o caso ou não.
A criação da joint venture entre as duas fabricantes foi anunciada em 2018. A nova empresa, chamada Boeing Brasil – Commercial, será liderada pela Boeing, com 80% de participação, enquanto a Embraer terá os 20% restantes. O acordo entre as duas partes também prevê a criação de uma segunda empresa para promover e oferecer suporte ao cargueiro militar KC-390 da Embraer.
A parceria entre as empresas também precisa ser chancelada pela União Europeia, que deve divulgar seu parecer até o dia 30 de abril.
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