Quando decolar pela primeira vez do Aeroporto de Navegantes nesta quinta-feira, 24 (caso o tempo ajude), o caça F-39E Gripen da Força Aérea Brasileira fará o país avançar décadas em capacidade de defesa aérea. Com exceção de poucos anos quando utilizou alguns Mirage 2000 de segunda mão, a FAB tem operado com caças bastante defasados (apesar de modernizados) nos últimos anos. A ironia é que o Gripen não é tão novo quanto se pensa. Trata-se de um projeto que começou a ser gestado pela Saab no final dos anos 70 e que voou pela primeira vez em dezembro de 1988, ou seja, há quase 32 anos.
Esse fato, é verdade, não significa absolutamente que o Brasil está comprando uma aeronave ‘velha’. Pelo contrário, a atual versão Gripen E/F é a mais atual da fabricante sueca e extremamente capaz. Mas ilustra uma realidade que envolve o desenvolvimento de aviões de combate, a de que seu custo e complexidade tornam esse segmento extremamente difícil. Tão difícil que tem feito algumas poderosas forças aéreas apelarem para versões repotencializadas de aviões veteranos como o F-15 Eagle, da Boeing. Uma variante atualizada do jato do começo da década de 70 acaba de ser encomendada pela Força Aérea dos EUA, a mais poderosa e avançada do planeta.
A evolução dos caças tem passado por um dilema desde que os EUA estrearam o F-22 Raptor, o primeiro jato de 5ª geração e que incorporou tecnologias extremamente avançadas na época, entre elas a capacidade “stealth” (furtiva). O caça da Lockheed Martin, no entanto, se mostrou complexo e caro de operar e com uma disponibilidade abaixo da esperada pela USAF. O pequeno e versátil F-35, também da mesma fabricante, não está muito longe dele, já tendo consumido bilhões de dólares sem ainda comprovar o prometido potencial.
A 5ª geração deu um passo tão grande que somente há poucos anos outros países têm conseguido ativar esquadrões com esses caças, caso da China com o J-20 e a Rússia, com o Su-57. Na Europa, outro tradicional celeiro de caças de combate, os atuais programas apontam para a 6ª geração, ainda mais avançada e, espera-se, mais eficiente. Enquanto isso, países como França, Alemanha, Suécia e Reino Unido dependem dos bons e confiáveis caças de 4ª geração, da qual o Gripen faz parte, assim como seus rivais Rafale e Eurofighter Typhoon.
A solução para contornar essa enorme lacuna de gerações foi desenvolver versões aprimoradas do projeto original. Como se sabe, um bom avião é capaz de absorver muita tecnologia e se manter relevante por muitos anos. O maior exemplo disso é o B-52, o bombardeiro de oito motores da USAF que irá conviver com o avançadíssimo B-21 Raider.
Geração 4++
Esses caças atualizados são referidos como da geração 4+ ou 4++, como ocorre com o Gripen E/F, chamado também de Gripen NG (nova geração) pela Saab. O projeto do caça aprimorado começou em 2007 para incorporar várias melhorias, incluindo a substituição do motor original GE F404 (montado sob licença na Suécia) pelo F414G usado pelo caça F/A-18E/F Super Hornet e a ampliação da capacidade de combustível.
A Saab incorporou mais avanços como um novo radar AESA (radar de varredura eletrônica ativa) Raven ES-05, sistema de busca e rastreamento infravermelha (IRST) e painel do tipo WAD (Wide Area Display, com enormes telas no lugar de mostradores analógicos), que equipará o modelo brasileiro. Graças ao novo turbofan, o Gripen E/F passou a ser capaz de superar a barreira do som sem uso de pós-combustores. O jato também passou a ter um peso máximo de decolagem mais alto, de 16,5 toneladas contra 14 toneladas do Gripen C. Com isso pode transportar mais combustível e resolver um dos alegados pontos fracos do projeto, o baixo alcance.
Apesar de a fabricante não incluir o dado em seu material, o Gripen E teria um raio de combate de cerca de 1.400 km com ajuda de tanques externos. Por falar nisso, o caça sueco possui nada menos que dez pontos de fixação externos que podem transportar uma grande variedade de armamentos e sensores.
Para corroborar a tradição de longos períodos de gestação, o Gripen brasileiro voará pela primeira vez em território nacional com destino a Gavião Peixoto, onde a Saab seguirá com os testes antes de iniciar as entregas à Força Aérea Brasileira em 2021. Apesar da espera, sem dúvida, o país voltará a ter uma capacidade respeitável de defesa aérea nos próximos anos, mesmo que esse avião tenha começado a ser pensado quatro décadas atrás.
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