A Embraer surpreendeu o mercado nesta semana ao confirmar que o projeto do turboélice avançado de passageiros deixou de ser uma prioridade na empresa. Até então, o programa era considerado um dos seus principais focos e seus executivos demonstravam enorme otimismo quanto ao potencial de vendas.
Em nota enviada ao Airway, a fabricante brasileira confirmou a expectativa positiva:“Os estudos de mercado conduzidos pela Embraer, aliados às discussões com diversas companhias aéreas, demonstram que há uma forte demanda global por aeronaves turboélices de nova geração”, afirmou.
No entanto, há uma clara dificuldade em obter componentes minimamente eficientes para que a aeronave, com capacidade entre 70 e 100 passageiros, possa oferecer um desempenho operacional convincente para seus potenciais clientes.
“O programa só se tornará viável caso alcance metas em desempenho, manutenção e sustentabilidade. Atualmente, as opções disponibilizadas por poucos fornecedores não alcançam todos esses indicadores”, explicou a empresa.
Por conta do cenário indefinido, “a Embraer decidiu adiar temporariamente a decisão de avançar com o projeto da aeronave turboélice de nova geração, mas seguirá trabalhando próximo a potenciais fornecedores ao longo de 2023 para garantir o cumprimento dos requisitos do programa”.
Cenário de transição
Mas o que pode ter levado a Embraer a mudar de ideia em poucos meses? Até então, o lançamento do programa era aguardado para o final deste ano, com início das vendas em 2023 e a entrada em serviço em 2028. A empresa até confirmou ter mais de 250 cartas de intenção de compra do novo avião, a maior parte da versão de 70 lugares, que rivalizaria com o bem sucedido ATR 72.
Obviamente, a companhia não detalhou qual aspecto a fez decidir postergar o projeto, mas é bastante provável que ele envolva os motores. O turboélice de passageiros apresentado por ela não é um projeto revolucionário até aqui, mas uma junção de características que podem dar a ele uma performance bastante superior aos modelos existentes no mercado.
Entre elas estão o compartilhamento da fuselagem com os E-Jets, a posição dos motores na cauda, que o torna mais silencioso que rivais, a altura reduzida do solo, que beneficia as operações em aeroportos com infraestrutura menor, e a incorporação de tecnologias já dominadas como o sistema de voo fly-by-wire, entre outras.
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É um pacote que certamente tornaria o turboélice brasileiro bastante atraente, mas o grande problema se chama “timing“, para usar um termo em inglês. A aviação comercial está no início de uma fase de mudanças profundas graças às metas de redução da emissão de carbono. Por conta disso, novas tecnologias disruptivas estão sendo desenvolvidas em várias frentes, de motores híbridos-elétricos a propulsão a hidrogênio e puramente a eletricidade.
Como não há um padrão claro a seguir, quem se aventurar a lançar um produto cedo demais pode arcar com um grande problema lá na frente. É como nos anos 80 quando a indústria de eletrônicos criou dois padrões de video-cassetes, o VHS e o Betamax. Quem apostou no segundo acabou perdendo.
Pratt & Whitney e Rolls-Royce
A recente evolução da família Energia, de aeronaves sustentáveis, dá pistas sobre a mudança de foco na Embraer. Embora sejam aeronaves bem menores e com horizonte distante, eles representam a linha de frente do futuro da empresa.
Claro que um turboélice tão grande não será convertido tão cedo para padrões novos por conta do baixo alcance e desempenho dessas tecnologias no início. Mas eles irão pavimentar o caminho para que aeronaves maiores sejam um dia transformadas.
A velocidade dessa transformação é que parece ser um grande incógnita atualmente. Sem motores convencionais muito mais eficientes disponíveis no mercado, a Embraer correria o risco de colocar um produto no mercado que em pouco tempo poderia se tornar obsoleto.
A empresa conversa com a Pratt & Whtiney, uma parceira importante atualmente e que também é dona do PW100/150, motor que domina o mercado. Além dela, a Rolls-Royce, que forneceu os motores AE 3007 que equipam seus ERJ, faz parte do projeto de uma aeronave regional de emissão zero em companhia da Embraer e da empresa Wideroe, da Noruega.
A despeito da decepção inicial, a decisão de esperar mais algum tempo antes de colocar o novo avião comercial no mercado parece sensata e pode render frutos num futuro não tão distante.
Apesar da frustração dessa aeronave não ser lançada, acho a decisão da Embraer correta pois tem que ser um “tiro certeiro” no mercado. Esperamos que ou no fim de 2023 até meados de 2024 ela tenha reunido todos os componentes necessários para lançar este produto. E com enorme sucesso.
Na verdade faz todo o sentido postergar o lançamento do projeto, não seria muito inteligente entrar no mercado que clama por inovação na questão de minimizar a poluição sem uma tecnologia de ponta, que efetivamente iria revolucionar o mercado, sabia decisão.
Não se gasta nada adiando, veja o A220 onde a Bombardier ventilou iniciar em 2004, e adiou por 4 anos para ter o motor. Programa lançado em 2008. Protótipo com vôo inaugural em inacreditável 5 anos depois (2013). E certificação em 2015.
Acredito que a aviação comercial regional precise hoje, e em função dos cenários futuros, a longo prazo, de aeronaves turboélices, pressurizadas e com capacidades entre 30 e 40 passageiros, com custos operacionais muito baixos afim de atender cidades em torno de 100 a 200 mil habitantes, como é o caso aqui da região Sudoeste do Paraná. Somos carentes desse transporte e certamente seria a receita certa para essas situações. Grande parte de cidades e regiões desse porte estão hoje desprovidas de uma opção e oportunidade desse tipo de transporte.
Análise interessante.