Os 25 anos do jato Airbus A319 no Brasil

Introduzida pela TAM em 1999, aeronave marcou o fim da hegemonia da Boeing no mercado doméstico após muitos anos
A319 da TAM
A TAM foi a pioneira em introduzir os Airbus de corredor único no Brasil. Foto: Aeroprints via Wikimedia Commons.

Quem viajava de avião nos voos domésticos do Brasil nos anos de 1980 e 1990, podia ter uma certeza: a quase totalidade dos voos eram feitos com aeronaves da Boeing, não importava se o voo era da Cruzeiro do Sul, Transbrasil, VARIG ou VASP, com honrosas exceções.

A mão forte do Departamento de Aviação Civil (DAC) unificou a frota doméstica de aviões comerciais em poucos modelos. A fabricante americana era sinônimo de conforto, confiabilidade e segurança, imagem que tenta resgatar nos dias atuais.

Uma das honrosas exceções era um bimotor holandês de 108 assentos, o Fokker 100, introduzido pela TAM em 1990. Confortável, silencioso, com baixo custo operacional e robustez, o jato regional conquistou não só a empresa de Rolim Amaro, mas os passageiros também e mesmo com dois acidentes em menos de um ano, o avião era o queridinho dos executivos dos Voos Direto ao Centro (VDC).

A Swissair foi a primeira empresa a operar os A319. Foto: AeroIcarus via Wikimedia Commons.

Só que o Fokker 100 não era um competidor do mesmo nível dos Boeing 737 onipresentes na época. Poderia operar nas mesmas rotas, mas não tinha o mesmo volume de carga no porão e o alcance era menor. Para piorar, a Fokker encerrou suas operações em 1996, deixando de atender diversos clientes, entre os quais a TAM. Em resumo, os Fokker 100 eram ideais para voos curtos e alta frequência.

Ciente disso, a TAM surpreendeu ao anunciar durante a FIDAE’98 a compra de 179 jatos A319 e A320 em conjunto com o Grupo TACA e a LANChile, na maior encomenda feita na América Latina e uma das maiores do mundo na época. Para a TAM, o pacote incluía 38 encomendas firmes e 37 opções, no total de US$ 1,5 bilhão, na maior compra feita por uma empresa aérea brasileira.

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A família A320, da Airbus, é um dos mais bem sucedidos programas aeronáuticos do mundo. Com adoção de várias tecnologias empregadas na aviação militar e nos ônibus espaciais, o A320 foi a aeronave comercial mais moderna do mundo quando entrou em operação, com a novidade do fly-by-wire e os sidesticks, que substituíram os tradicionais manches dos aviões.

O primeiro A320 decolou no dia 22 de fevereiro de 1987 e entrou em serviço em 1988 na Air France. Com capacidade inicial para transportar 165 passageiros, o A320 foi o primeiro narrowbody (fuselagem de um corredor) da Airbus. A partir dele originou os modelos A321 (entrada em operação em 27 de janeiro de 1994), com capacidade de 190 passageiros em classe única; o A319, com 132 passageiros (25 de abril de 1996) ; e o A318 com 120 passageiros (22 de junho de 2003).

Um Airbus A319 da TAM foi o 4 000º jato da família A320 entregue (Airbus)

A briga na Ponte Aérea

O ano de 1998 foi de intensa guerra tarifária entre as empresas aéreas brasileiras. Com a banda de ajuste de tarifa alargada pelo DAC, TAM e VARIG abaixavam constantemente os preços para competir com a outra, com a VASP e Transbrasil acompanhando de forma reativa, sem tanta força financeira.

O principal palco da competição era a Ponte Aérea Rio-São Paulo. Com fluxo de milhares de passageiros, entre artistas, famosos e executivos, a rota é até hoje a vitrine da aviação comercial brasileira.

A TAM competia com os Fokker 100 contra o pool formado pela Transbrasil, VARIG e VASP, que operavam o Boeing 737-300. Outra concorrente era a Rio-Sul, que operava com os menores 737-500. Naquele mesmo ano, a VARIG sairia do pool para formar com sua subsidiária a Ponte VARIG/Rio-Sul.

Parte da encomenda dos A320 foi alocada para o A319, que possuía capacidade de pousar em pista curta como Ilhéus, na Bahia, e Santos Dumont, no Rio de Janeiro.

Em 09 de julho de 1999, os A319 PT-MZA e PT-MZB chegaram ao Rio de Janeiro/Galeão e carregando um feito histórico: ambos quebraram o recorde de autonomia do A319 ao operarem entre Casablanca e o aeroporto carioca sem escalas, um feito que mostrava a versatilidade do avião.

PR-MBW com as cores da TAM da década de 1970. Foto: Christian Volpati via Wikimedia Commons.

Para adequação e treinamento de tripulações, a TAM colocou seus primeiros A319 nos voos para Florianópolis e Navegantes, antes de empregá-los na Ponte Aérea.

O A319 veio com 120 assentos, sendo 112 na econômica e 8 na Super Classe, marcando a primeira aeronave a voar com classe executiva na Ponte Aérea. Entre as novidades foram monitores de LCD sob os bins e a poltrona do meio mais larga que o restante.

Como meses antes a TAM tinha recebido o A330-200 e o chamava simplesmente de “Airbus”, a TAM continuou com a mesma tática ao anunciar que o Airbus operaria na Ponte Aérea também.

A reação da VARIG foi imediata, colando na ponte os também modernos 737-700 recém-adquiridos, igualando a TAM em termos de tecnologia de equipamento e conforto. Até o fim daquele ano a TAM teria seis A319 em operação.

O A319 nas empresas aéreas brasileiras

No total, 42 unidades do A319 operaram no Brasil, a maioria na TAM e na sucessora LATAM Airlines Brasil, com frotas menores operadas pela Avianca Brasil, Itapemirim, Pantanal e a Força Aérea Brasileira.

TAM (1999-2016)

A TAM foi a primeira operadora do modelo e chegou a ter 32 A319 entre 1999 e 2016, quando oficialmente virou LATAM Airlines Brasil. Os jatos operavam na Ponte Aérea Rio-São Paulo e rotas com restrições de pista, como Ilhéus.

Os A319 eram confortáveis com duas classes, porém, com a crise econômica e a difícil aceitação do público brasileiro em ter classe executiva em voos curtos fizeram com que a TAM reconfigurasse seus jatos em classe única de 132 assentos.

Posteriormente, com mudanças no layout interno dos lavatórios e galley, o A319 passou a ter 144 assentos.

Jatos A319 da TAM em Congonhas
Jatos A319 da TAM em Congonhas (João Carlos Medau)

Em maio de 2010 a TAM lançou o Projeto Vintage, na qual resgatava a história da empresa nas décadas de 1970 e 1980, além de promover o Museu Asas de um Sonho, patrocinado pela empresa. Para o projeto, dois A319 foram pintados com os padrões visuais do passado: o PR-MBW (Década de 1970) e PT-TMD (Década de 1980).

PT-TMD com as cores da empresa na década de 1980
PT-TMD com as cores da empresa na década de 1980. Foto: Christian Volpati via Wikimedia Commons.

Coube ao PT-TMA ser a 4.000ª aeronave da família A320 construída pela Airbus. O avião recebeu uma pequena pintura sob o logotipo.

Não foram apenas as pinturas as integrantes do projeto. O interior dos aviões, uniformes e vídeos de segurança eram baseados nos estilos da época. Os aviões ficaram principalmente na Ponte Aérea, com aparições pontuais em Ribeirão Preto e Navegantes.

Em 05 de maio de 2016, a TAM transformou-se em LATAM Airlines Brasil e esta recebeu os 29 A319-100 ainda operados pela antecessora. Antes da mudança de nome, três A319 tinham sido desmontados naquele ano: PR-MBI, PT-MZD e PT-MZF.

Força Aérea Brasileira (2005-)

A Força Aérea Brasileira (FAB) possui um A319CJ – Corporate Jetliner, alocado no Grupo de Transporte Especial (GTE) como avião presidencial. Adquirido em 2003 e recebido em 14 de janeiro de 2005, o avião presidencial substituiu os 707 nos voos internacionais e pode operar nos mesmos aeroportos que a dupla de 737-200 presidenciais faziam. Recebeu na FAB a designação VC-1A e prefixo 2101, com o primeiro voo oficial entre Brasília e Tabatinga.

O VC-1, o principal avião presidencial da FAB. A adição das faixas verde e amarela ocorreu em 2013. Foto: FAB.

Batizado de Santos Dumont, o avião presidencial possuí sala de reuniões, suíte presidencial, escritório de segurança, cabine para autoridades de Estado e cabine traseira para a comitiva. Além do preço de US$ 56,7 milhões gastos pela aquisição, foram dispensados US$ 13,5 milhões para remodelação do interior e US$ 4,6 milhões em software e peças sobressalentes.

Sala de reuniões do VC-1. Foto: Agência Brasil via Wikimedia Commons.

Avianca Brasil (2010-2019)

A chegada dos A319 representou um ponto de inflexão, quando a empresa deixou de se chamar Oceanair e passou a ser conhecida como Avianca Brasil. O A319 PR-AVB foi a primeira aeronave a ostentar a nova identidade, em 27 de abril de 2010, com voo inaugural entre Congonhas e Brasília.

A Avianca Brasil passou a se posicionar como uma empresa com serviço diferenciado e seu trio de A319 refletia isso: as 132 poltronas possuíam pitch maior, monitores de TV individuais e refeições quentes. Os aviões ficaram na Ponte Aérea e realizavam alguns voos pontuais fora desta rota.

Airbus A319 da Avianca Brasil
Confortáveis e com bons serviços de bordo, o A319 marcou o renascimento da Oceanair, agora denominada Avianca Brasil. Divulgação.

A estreia internacional dos A319 ocorreu na rota Guarulhos-Bogotá, como uma espécie de terceirizada da Avianca Colombia, empresa associada. Por um tempo, esse voo foi estendido até Cidade do Panamá, a fim de atender sua homóloga colombiana. Posteriormente, a Avianca Brasil lançou voos semanais saindo de Fortaleza, Recife e Salvador para cumprir as exigências de voos internacionais com objetivo ter desconto no combustível.

O PR-AVB recebeu as cores da Star Alliance quando a empresa entrou na aliança, e o PR-AVD foi o primeiro A319 a ter as novas cores da companhia.

O quarto e último A319 da Avianca Brasil foi o PR-ONJ, recebido em 26 de junho de 2012. O quarteto de aeronaves ficou até os últimos dias da companhia. Os jatos PR-AVB, PR-AVC e PR-AVD foram desmontados e o PR-ONJ foi para a Myanmar Airways International.

Pantanal (2010-2011)

Logo após a compra pela TAM, a Pantanal recebeu o PT-MZD e PT-MZE da empresa matriz. A dupla operou entre agosto de 2010 até agosto de 2011. A úncia diferença era que os aviões possuíam um adesivo escrito “A serviço da Pantanal” abaixo das janelas do cockpit.

Latam Airlines Brasil (2016-)

A sucessora da LATAM tinha em 2024 19 jatos A319 em operação, alguns que foram recebidos das subsidiárias chilena, colombiana e equatoriana do LATAM Airlines Group. A certificação dos A320neo para pousarem no Aeroporto Santos Dumont, no Rio de Janeiro, fez com que a maioria dos A319 não seja mais pertinente à Ponte Aérea. A LATAM nanteve a mesma configuração de assentos da TAM com 144 lugares.

Airbus A319 Latam Airlines Brasil
Airbus A319 Latam Airlines Brasil (Rafael Luiz Canossa)

Itapemirim Transportes Aéreos (2021)

A Itapemirim Transportes Aéreos (ITA) tinha planos ambiciosos de operar o A319 e o A320 para as operações domésticas. Chegou a trazer um modelo, o PS-SIL, em homenagem a conselheira do Grupo Itapemirim, Silvana Piva. O segundo A319, PS-JCP, recebeu as cores da empresa, porém, não chegou a vir ao Brasil. Além disso, haviam reserva para PS-GSP, ex-Mexicana XA-UER.

 
A Itapemirim operou o A319 por pouco tempo
O A319 PS-JCP chegou a receber a pintura da Itapemirim, mas não foi entregue (Stamaviaton)

O PS-SIL veio nas cores da operadora HiFly Malta com adesivo da Itapemirim. Seria o primeiro A319 com quatro saídas de emergência sobre as asas.

A Itapemirim pretendia colocar em serviço o A319, mas não houve tempo. Foto: Divulgação.

A pretensão era ter os A319 configurados para 124 assentos, sendo 42 na Classe ITA, com maior espaço para as pernas. Entretanto a crise que a empresa passava fez com que os planos fossem cancelados.

Sucessor A319neo não atraiu interessados

Se em sua carreira, o A319 atraiu diversos clientes que encomendaram 1.484 aeronaves, seu substituto direto, o A319neo, tem se mostrado uma decepção em vendas para a Airbus.

Mesmo com um desempenho superior ao antecessor, o A319neo tinha apenas 61 pedidos firmes em fevereiro de 2024, boa parte de empresas aéreas chinesas e clientes VIP.

O A319neo pode realizar viagens de até 6.950 km (Airbus)
O A319neo pode realizar viagens de até 6.950 km (Airbus)

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