Foi no dia 21 de dezembro de 1970 que um imenso e icônico caça de combate realizava seu primeiro voo, nas instalações da Marinha dos EUA em Calverton, em Long Island (Nova York). Tratava-se do F-14 Tomcat, genuíno herdeiro dos caças embarcados da Grumman que foram usados sobretudo na Segunda Guerra Mundial.
Cinquenta anos depois do voo inaugural, o jato de asas de geometria variável ainda povoa a mente de vários entusiastas e mantém sua popularidade, conquistada sobretudo após ser ‘protagonista’ junto com de Tom Cruise no filme Top Gun, lançado na década de 80 e que alçou o ator ao estrelato.
Mas o F-14 poderia nem ter existido não fosse a insistência da US Navy em contar com um sucessor próprio para o F-4 Phantom. Na década de 60, o então secretário de defesa do EUA, Robert McNamara, insistiu para que a Marinha entrasse na concorrência TFX (Tactical Fighter Experimental) da Força Aérea dos EUA a fim de reduzir os custos de desenvolvimento.
O jato vencedor dessa concorrência, o F-111, da General Dynamics, no entanto, era tudo menos um avião embarcado eficiente. Muito pesado e pouco manobrável, o F-111B, a versão da US Navy, foi logo descartada em favor do programa VFX, vencido pela Grumman em 1968.
Apesar de ser um novo projeto, F-14 herdou soluções trazidas pelo F-111 como os motores TF-30, o radar AWG-9, os mísseis ar-ar de longo alcance AIM-54 Phoenix e, sobretudo, as asas de geometria variável. Mas o Tomcat era um caça ágil a despeito do tamanho avantajado (o maior caça embarcado já fabricado até então).
Com dois assentos em tandem, empenagem dupla e entradas de ar com partes móveis, o F-14 era capaz de voar até Mach 2.2 (2.713 km/h), porém, os motores TF-30 se revelaram o calcanhar de aquiles do projeto. Embora tenham sido uma solução provisória, os turbofans acabaram adotados nos aviões de série, só substituídos anos depois na variante F-14D. Para acelerar o programa, a Grumman partiu para a construção do primeiro avião definitivo, por isso o F-14 voou apenas 22 meses após a fabricante vencer a concorrência.
Para a época, o Tomcat era um avanço enorme no segmento de aviões de combate. Nem mesmo a USAF possuía um jato tão capaz, algo que só ocorreu alguns anos depois com o F-15 Eagle. Além de oferecer boa capacidade em dogfights, o jato da Grumman era imbatível como interceptador de longo alcance graças à dupla AWG-9 e AIM-54 Phoenix. Com até seis mísseis, ele era capaz de destruir bombardeiros a quase 200 km de distância e de forma quase simultânea.
As asas de geometria variável eram uma solução bem pensada para reduzir a velocidade no pouso em porta-aviões além de facilitar sua hangaragem nos apertados espaços no convés.
Batismo de fogo
O F-14 Tomcat começou a substituir o Phantom nos porta-aviões dos EUA em 1974, mas o batismo de fogo só ocorreria em 1981 durante um incidente no Golfo de Sidra quando dois caças derrubaram uma dupla de Sukhoi Su-22 líbios. Oito anos depois, um novo encontro com aviões do país africano terminou com mais uma vitória implacável do caça norte-americano, que desta vez abateu dois MiG-23.
Apesar de sua enorme capacidade, o F-14 passou seus últimos anos em funções secundárias de reconhecimento e mesmo de ataque. Durante os conflitos no Oriente Médio, o Tomcat foi usado no Iraque e no Afeganistão, por exemplo, mas foi preterido em favor do F-15 em patrulhas sobre a região. Ainda assim, o único caça perdido em combate foi derrubado por um míssil terra-ar iraquiano em 1991.
Nesse mesmo ano, a Grumman passou a entregar o F-14D Super Tomcat, uma versão aprimorada com aviônicos mais modernos como o radar AN/APG-71, pod de rastreamento infravermelho, telas digitais e sobretudo o motor GE F1110 no lugar do P&W TF-30.
A despeito de melhorar significativamente o desempenho do caça, o novo motor só foi aplicado a 18 unidades do F-14A além de 37 novos F-14D. Ambos os turbofans tiraram parte do brilho da aeronave ao não permitirem que seus pilotos pudessem explorar todo o potencial do projeto.
Após o fim da União Soviética, a função de interceptação do F-14 perdeu prioridade e o secretário de Defesa do governo Bush, Dick Cheney, preferiu investir numa versão potencializada do F/A-18 Hornet, o “Super Hornet”, do que continuar a modernizar o Tomcat, ao qual chamou de “avião da década de 60”.
Ainda assim, o F-14 só deixou o serviço em 2006 após 32 anos como o principal avião de combate da US Navy. Ironicamente, os únicos Tomcat operacionais atualmente voam no Irã, graças ao único episódio de exportação da aeronave, poucos anos antes da Revolução Islâmica no país.
Protagonismo no cinema
Na época em que foi aposentado nos EUA, o Tomcat já havia feito fama em Hollywood ao ser usado como caça do personagem Pete ‘Maverick’ Mitchell, vivido pelo ator Tom Cruise no filme Top Gun (Ases Indomáveis). A despeito do roteiro inverossímil e dos combates aéreos com situações forçadas, o filme contribuiu para atrair novos recrutas para a Marinha, que apoiou a produção ao fornecer aviões e locações em suas instalações em San Diego, na Califórnia.
Mas Top Gun não foi o ‘debut’ do Tomcat no cinema. No final dos anos 70, o pouco conhecido filme The Final Countdown (O Nimitz Volta ao Inferno na versão brasileira) mostrava os F-14 do esquadrão Jolly Rogers com suas caudas pretas e a insígnia de pirata numa missão que colocou o porta-aviões nuclear em pleno ano de 1941 horas antes do ataque à Pearl Harbor. Imagine um caça supersônico prestes a enfrentar os Zero japoneses…
Se hoje o F-14 é um item de museu nos EUA ao menos na sequência de Top Gun (Maverick), que será lançada em julho de 2021, o caça da Grumman deve voltar a dar o ar da graça, mas voando possivelmente apenas em versão digital. Nada mal para um senhor de 50 anos.
Veja também: Marinha do EUA recebe os primeiros caças F/A-18 Super Hornet Block III
Apenas uma pequena correção sobre a remotorização dos F-14, na matéria diz que o motor só foi substituído nos F-14D porém em 1987diversos F-14A receberam upgrade de motor e foram redesignados como F-14A+ e posteriormente F-14B, Vale ressaltar também que o F-14D foi a primeira aeronave a operar um sistema HOVER onde as unidades em solo conseguiam ter acesso em tempo real as imagem do pod do caça, dentre alguns outros updates que o foram adicionados na década de 90 aos F-14A/B como sistema de GPS ao invés apenas da navegação inercial e a integração com bombas inteligentes JDAM, ademais excelente matéria, sempre será uma aeronave que viverá na memoria dos apaixonados por aviação.
Corrigindo meu comentário também o sistema chamava-se ROVER e não HOVER. (Remotely Operated Video Enhanced Receiver )