Antes da invenção do avião uma simples viagem de 500 km era uma epopeia. Essa é a distância, por exemplo, que separa Paris de Londres, ou então São Paulo do Rio de Janeiro. No início do século 20, esses trajetos eram realizados por terra, em rudimentares veículos automotores ou com tração animal, ou pelo mar, em embarcações. Nesses dois modos, trajetos que hoje são cumpridos em questão de minutos, levavam muitas horas ou então mais de um dia para serem completados.
O único meio aéreo desse tempo, embora restrito somente aos mais abastados, eram os dirigíveis, lentos e perigosos, ao passo que os primeiros aviões, que surgiram na década de 1910, podiam levar no máximo dois ocupantes, sendo um deles o piloto, fato que inviabilizava o transporte comercial em massa sobre asas.
Com a invenção de motores mais eficientes e o uso de materiais mais leves, a evolução do avião disparou. Cada vez mais rápidos, seguros e maiores, as aeronaves se tornaram capazes de transportar cargas e passageiros, criando conexões rápidas entre cidades, países e continentes, até então separados por dias, semanas ou meses de distância.
Segundo estimativa mais recente da Organização Internacional de Aviação Civil (ICAO), a aviação comercial tem potencial para transportar mais de 3,5 bilhões de pessoas por ano, ou metade da população mundial atual. Conheça a seguir as aeronaves que tornaram isso possível:
Sikorsky Ilya Muromets
Considerado o primeiro avião projetado para uso comercial, o Sikorsky Ilya Muromets, desenvolvido no antigo Império Russo, voou em 1913. Podia transportar 16 ocupantes, acomodados em uma luxuosa cabine, e realizar viagens de até 1.000 km, voando a 110 km/h. O destino, porém, forçou uma mudança no papel desempenhado pela aeronave, cuja capacidade de carga e longo alcance foi melhor aproveitada na função de bombardeiro, durante o período da Primeira Guerra Mundial. O aparelho era capaz de voar carregando 800 kg de bombas, ou de passageiros. Seu único operador comercial foi a “Frota Aérea Civil da União Soviética”, que mais adiante se transformou na companhia aérea Aeroflot, até hoje na ativa.
Junkers F13
Pequeno e com capacidade para apenas quatro passageiros, o Junkers F13, fabricado na Alemanha, abriu novos caminhos no desenvolvimento da aviação, a partir de 1919, ano de seu primeiro voo. Totalmente construído em metal e monoplano, a aeronave era segura e resistente, para os padrões da época, o que ajudou na viabilização de rotas aéreas comerciais no mundo todo. Foi adotado por empresas em sua terra natal, Estados Unidos e até no Brasil, onde voou com as cores da Varig. O F13 voava próximo dos 200 km/h e tinha autonomia de até 1.400 km, um desempenho considerado excepcional no início da década de 1920.
Handley Page Type W
Hoje algo corriqueiro em aeronaves comerciais, o banheiro a bordo foi uma evolução brilhante em 1921, quando entrou em operação o biplano Handley Page Type W, fabricado no Reino Unido. O avião tinha capacidade para transportar 15 passageiros e também foi um dos primeiros a contar com serviço de bordo, oferecido pela Imperial Airways, empresa britânica que antecedeu a BOAC, uma das companhias aéreas mais importantes do mundo até a década de 1970. No entanto, com o surgimento de opções mais avançadas, sua atuação comercial foi breve. O legado do toalete aéreo, porém, foi fundamental para a evolução da aviação comercial.
Boeing 274
Descrito como o primeiro avião comercial moderno, o Boeing 247, de 1933, ditou os padrões da aviação comercial como conhecemos hoje. Contava com trem de pouso retrátil, fuselagem e asas de alumínio, era rápido (alcançava 320 km/h) e vinha equipado até mesmo com sistema de piloto automático, que permitia, por exemplo, manter a altitude estabilizada sem a necessidade constante de correções no comando. O interior comportava até 10 passageiros. A aeronave voou no Brasil na década de 1940, com a companhia Viação Aérea Bahiana.
Douglas DC-3
Desenvolvido para rivalizar com o Boeing 247, o Douglas DC-3 permitiu a expansão da aviação comercial no mundo todo. Com mais de 10 mil unidades produzidas, o aparelho com capacidade para 28 passageiros foi o primeiro de muitas companhias aéreas. O modelo foi lançado em 1935, no entando sua utilização no transporte de passageiro ganhou notoriedade somente após o final da Segunda Guerra Mundial, quando milhares de unidades militares foram convertidas para o uso civil. Era uma aeronave de grande autonomia (2.400 km), o que permitiu a inauguração de uma série de rotas internacionais. No Brasil, voou com empresas como a VASP e a Varig. Até hoje existem unidades em plena capacidade de voo.
Boeing 307 Stratoliner
Primeiro avião comercial com cabine pressurizada, o Boeing 307 Stratoliner, de 1937, podia voar a mais de 6.000 metros de altitude, o que permitia voar de forma mais segura e rápida, evitando o mal tempo abaixo das nuvens. Apesar da boa capacidade de passageiros, com espaço para até 38 ocupantes, e desempenho eficiente para época, a aeronave foi um fracasso comercial: apenas 10 unidades foram produzidas. As lições aprendidas com o Stratoliner, contudo, foram fundamentais para o desenvolvimento de aeronaves mais avançadas.
Lockheed Constellation
Com uma autonomia de quase 9.000 km, o Lockheed Constellation foi o primeiro avião capaz de cruzar continentes sem precisar realizar escalas para reabastecer. Lançado em 1943 nos EUA, o modelo foi sucesso no mundo todo, estabelecendo rotas antes consideradas impossíveis. Sua capacidade de passageiros também era algo invejável, com quase 100 assentos, o que fez do Constellation o maior e mais importante avião comercial até o final da década 1950, quando começaram a surgir os primeiro jatos.
De Havilland Comet
Primeiro avião comercial impulsionado com motores a jato, o De Havilland Comet, desenvolvido no Reino Unido, alcançava o dobro da velocidade dos aviões com motores a hélice, beirando os 900 km/h. A aeronave com quatro reatores foi introduzida em 1952, mas quatro anos depois todas as unidades produzidas foram paralisadas em solo: o modelo sofria de problemas estruturais que podiam ocasionar descompressões explosivas em voo. Após a correção dos erros, o Comet voltou a ativa em 1958 e prestou serviços na aviação comercial até 1997.
Tupolev Tu-104
Segundo avião comercial com motores a jato a entrar em operação na história, em 1955, o soviético Tupolev Tu-104 foi o único de seu tipo a voar entre 1956 e 1958, tempo em que o Comet parou para solucionar problemas estruturais. Diferentemente do concorrente britânico, a aeronave da Tupolev era mais rápida (alcançava quase 1.000 km/h), mas utilizando a força de apenas dois motores a reação. Em contrapartida, seu alcance era menor, de 2.700 km. Foi comprado apenas por empresas de países ligadas ao antigo bloco comunista, enquanto o jato da De Havilland foi vendido em todo o Ocidente.
Boeing 707
Aeronave que tornou viável a “era do jato”, o Boeing 707 foi o primeiro avião comercial com motores a reação desenvolvido nos EUA, em 1958. Também foi o primeiro jato capaz de realizar voos transatlânticos, encurtando consideravelmente o tempo de viagem entre continentes, com velocidade máxima de 960 km/h. A partir do 707, a Boeing aprendeu lições que resultaram em aeronaves cada vez maiores e mais eficientes. O aparelho, na versão comercial, foi produzido até 1978.
Boeing 737
Prestes a completar 50 anos, o Boeing 737 é o avião comercial a jato mais popular do mundo, com mais de 9.000 unidades produzidas. As primeiras versões foram concebidas para rotas curtas e com o passar dos anos, com a criação de motores mais eficientes, o avião evoluiu para cumprir trechos de média distância. O porte do 737 também mudou significativamente: as primeiras versões levavam 85 passageiros, ao passo que os modelos mais recentes tem espaço para até 180 ocupantes. No Brasil, o aparelho voa com as cores da companhia Gol.
Boeing 747
Voando comercialmente desde 1970, o Boeing 747 foi durante 37 anos o maior avião de passageiros do mundo, superado apenas pelo Airbus A380. Chamado de Jumbo ou ainda de Queen of the Skies (Rainha dos Céus), o 747 foi a aeronave responsável por popularizar as viagens internacionais, uma vez que a enorme quantidade de assentos (para mais de 400 ocupantes) permitia equilibrar os preços dos bilhetes com os custos operacionais. Considerado dispendioso para os tempos atuais, o gigante da Boeing caminha para seus últimos suspiros na aviação comercial: a produção deve ser encerrada até o final desta década.
BAC/ Aerospatiale Concorde
Desde que o Concorde foi aposentado, em 2003, a aviação comercial retrocedeu em velocidade. Capaz de voar a 2.179 km/h, ou duas vezes a velocidade do som, a aeronave podia viajar da Europa aos EUA em meras três horas, o equivalente a 1/3 da capacidade dos jatos atuais, mesmo os mais velozes. Foi operado somente pela Air France e a British Airways, com capacidade para até 120 passageiros. Devido aos altíssimos custos com combustível para o voo supersônico, até hoje não teve um substituto.
Airbus A300
Primeiro avião desenvolvido pela Airbus, o A300 também é o pioneiro do segmento de aeronaves comerciais de fuselagem larga (widebody) com apenas dois motores, atual segmento mais procurado por companhias aéreas para rotas de longo curso. O modelo também foi o primeiro jato comercial convencional com comandos computadorizados, o fly-by-wire – o Concorde foi o primeiro a usar esses comandos na aviação comercial. Pode transportar cerca de 280 passageiros, percorrendo médias distâncias, de cerca de 5.200 km. Foi produzido entre 1972 e 2007. Hoje é popular na aviação de carga.
Boeing 777
Maior aeronave bimotor a jato da atualidade, com capacidade para mais de 350 passageiros, o Boeing 777 também foi o primeiro avião comercial desenvolvido inteiramente por computador. Produzido desde 1993, o “triple-seven” é uma das aeronaves de longo curso mais populares do mundo, com mais de 1.400 unidades em serviço, operando em rotas que cruzam praticamente a metade do planeta – o modelo tem autonomia de até 17.000 km.
Airbus A380
Maior avião de passageiros da história, o Airbus A380 desbancou o Boeing 747 em 2007, quando entrou em operação comercial. Se configurado apenas com uma classe, a aeronave pode transportar mais de 800 passageiros, embora esse layout nunca tenha sido escolhido por seus operadores, que preferem a configuração com capacidade máxima de 500 ocupantes. Apesar da capacidade sem igual e um desempenho e capacidades formidáveis, o gigante da Airbus é um avião caríssimo de operar, fato que vem diminuindo suas encomendas.
Boeing 787 Dreamliner
Primeiro avião comercial fabricado com materiais compostos em grande escala, como fibra de carbono, o Boeing 787 prioriza a eficiência em consumo de combustível. Segundo a fabricante, o consumo da aeronave é cerca de 25% inferior aos de jatos do mesmo porte da geração anterior, além de trazer avanços notáveis em redução de ruídos, utilizando motores de última geração. Na maior versão, o 787-10, o Dreamliner pode ser configurado para transportar até 330 passageiros e realizar rotas de até 14.000 km.
Veja mais: CBA 123, o super-avião da Embraer que ficou no passado
Belíssimo artigo, Thiago.
Impressionante a rapidez do desenvolvimento inicial da aviação. Um avião como o Sikorsky Ilya Muromets foi desenvolvido só 7 anos depois do 14 bis. Ao contrário do que imagina o senso comum, parece que a velocidade com que a tecnologia evolui atualmente não é muito mais extraordinária do que em outros tempos.
Entre os aviões listados como mais importantes da história, senti falta do Antonov An 225 que, apesar de apenas 1 unidade ter sido fabricada (e ainda em operação), uma máquina daquele porte é um grande marco da aviação, tal como o Jumbo, o Airbus A-380 e o Concorde, cada um do seu jeito. Ademais, quanto a essa questão do número de unidades produzidas, o An-225 não difere muito do Boeing 307 citado acima. Enquanto este se destaca como a primeira cabine pressurizada, por sua vez o maior cargueiro de todos os tempos também se destaca.
José, o artigo é bastante específico, aviões comerciais…
Mas enfim, concordo que foi muito bem escrito e bastante coerente, mostrando a contribuição tecnológica de cada uma dessas aeronaves, inclusive o primeiro banheiro a bordo…sensacional!
Aparentemente o Boeing 707 ditou o padrão estético depois de seu lançamento, com pouquíssimas variações, exceto os gigantes 747 e A380.
Ainda torcendo para que algo realmente novo apareça…
Vou sentir falta dos grandes quadrimotores, voei no 707 e 747 mas infelizmente não tive a chance de voar nos magníficos DC-8 e Convair-990, o mais veloz de todos. Como todo paulistano do meu temo adorava ficar vendo as aeronaves do terraço do Aeroporto de Congonhas. Em um desses dias pela manhã coincidentemente, acho que em 1972, pousou o primeiro Boeing 727-100 da Varig, tinha acabado de chegar da fabrica, novinho em folha, foi uma festa, um monte de gente em volta da aeronave, nunca me esqueci.
Meu primeiro voo fui em um Handley Page Dart Herald, da Sadia…já se vão alguns anos…tenho boas recordações de meu primeiro voo para o exterior num McDonnell Douglas DC-10, assim como do saudoso Electra, da Ponte Aérea. Minha maior frustração, entretanto, foi a de nunca ter voado num 747, minha última viagem teve um 777-200 na ida e um 767-300 na volta.
Falar de importância, deveria ser citado o DC-8, concorrente direto do B 707. O 767 foi é muito mais importante do que o A 310. A partir da confiabilidade do 767, surgiram outros aviões biturbinas ETOPS.
Saudações. Eu gostaria de mencionar um avião dos anos 60 chamado Caravelle. Fabricado na França foi o primeiro avião comercial a apresentar as turbinas na parte traseira da fuselagem, tinha linhas consideradas elegantes à época e voou muito no Brasil sob as cores, se bem me lembro, da Cruzeiro do Sul.
Está faltando o SE – 210 Caravelle e o Lockheed L-188 Electra!
Muito boa a matéria. Um passeio pela história da aviação comercial.
Parabens pela matéria, conforme comentarios anteriores, o 767 merecia um destaque pois foi ele o responsavel pela certificação ETOPS (1986)
Nessa lista faltou os memoraveis DC-10 E MD 11. Esse último era lindo com aquela turbina encima da fuselagem.
Kd I DC-10 da Varig ?
Faltou o Lockheed L-188 ELECTRA, avião comercial de médio porte, primeiro turboélice comercial de fabricação norte-americana projetado e construído pela Lockheed. Voou pela primeira vez em 1957 a até recentemente algumas unidades ainda voavam na África.
MUITO BOA ESTA MATÉRIA VIU GENTE!
PARABÉNS A QUEM FEZ E TEVE A IDEIA!
Complementando a informação do colega Ricardo…segundo a Wikipedia, o Sud Aviation Caravelle foi introduzido pela Scandinavian Airlines System (SAS) em abril de 1959, e realmente foi o primeiro a adotar a solução das turbinas no corpo da aeronave, e não nas asas, desenho utilizado até hoje em aeronaves de pequeno e médio porte. Foram produzidas 282 unidades de várias versões, sendo que no Brasil, foi operado por Cruzeiro do Sul, Panair e Varig.
Certamente existem ou existiram outras aeronaves importantes no processo de desenvolvimento da aviação comercial, mas creio que o critério utilizado aqui foi o do ineditismo, sempre trazendo o primeiro a avançar em algum ponto em específico – por este motivo a escolha do Airbus A300 ao invés do Boeing 767, pelo fato de que o primeiro teve o mérito de ter sido o pioneiro. Por isso o Boeing 307, independente de ter tido somente 10 unidades comercializadas, mas pelo fato de ter sido o primeiro a ser pressurizado, figura nesta listagem. Acho coerente o critério, e como já dito aqui, fantástica a lista…novamente, obrigado pelas informações, Thiago!
Nunca voei num, mas eu acho muito bacana ver o 747 nos aeroportos.