Primeiro voo supersônico completa 70 anos

Feito foi alcançado com o “avião-foguete” Bell X-1 comandado pelo lendário piloto Chuck Yeager
(Domínio Público)
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Os aviões mais rápidos desenvolvidos na década de 1940, ainda com motores a hélice ou mesmo os primeiros jatos, alcançavam no máximo 700 km/h ou pouco mais de 900 km/h. Ao voar além dessas marcas, os pilotos sentiam suas aeronaves sendo seguradas por uma força invisível, que fazia o avião tremer perigosamente e até mesmo quebrar suas asas. Esse era o efeito da turbulência da barreira sônica, uma nova dimensão da velocidade onde um objeto pode ser mais veloz que uma onda de propagação de som. É mais rápido que o eco da sua voz.

Os pilotos buscavam o número mágico Mach 1, a medida criada pelo físico austríaco Ernst Mach, que conseguiu medir a velocidade do deslocamento do som no final do século 19. O estudioso europeu ainda apontou que a velocidade de propagação sonora variava sob influência da temperatura e pressão. Por isso referência da medida Mach, que ao ser citada já pressupõe as condições de variações atmosféricas.

Nas referências convencionais, Mach 1 é o equivalente a 340 metros por segundo ou 1.284 km/h, ao nível do mar, com maior concentração de oxigênio. A 10.500 metros de altitude, com o atrito reduzido pelo ar rarefeito, os valores mudam: 301 m/h ou 1.085 km/h.

Essas são as velocidades onde os aviões encontram a barreira sônica. Voando nesse ritmo, a aeronave “bate” em um acúmulo de pressão com a mesma velocidade de sua propagação. Os aviões dos anos 1940, porém, não possuíam motores potentes o suficiente, tampouco o design específico e, sobretudo, resistente para furar a barreira do som. Era era preciso um novo tipo de avião, forte e muito potente.

Mais rápido que uma bala

O primeiro avião construído para superar a barreira do som foi o protótipo XS-1, projetado pela Bell Aircraft contratada pelo Comitê Consultivo Nacional de Aeronáutica (NACA) dos Estados Unidos, em março de 1945. A fabricante apresentou uma proposta e em pouco tempo, no ano seguinte, já testava o protótipo XS-1 (de Experimental, Supersônico), na época descrito como uma de “bala com asas”.

O programa de testes do X-1 foi iniciado em janeiro de 1946 (Domínio Público)
O programa de testes do X-1 foi iniciado em janeiro de 1946 (Domínio Público)

O primeiro homem a comandar o XS-1, ainda em voo planado, foi Jack Woolams, ex-militar veterano da Segunda Guerra Mundial que no final do conflito foi contratado como piloto de testes pela Bell.

A carreira de Woolams, porém, foi interrompida de forma súbita. O piloto, então dono do recorde de altitude para aviões e o primeiro norte-americano a cruzar o Oceano Atlântico voando sem realizar paradas, morreu ao sofrer um acidente com seu P-39 Aircobra enquanto treinava para o campeonato nacional de corridas aéreas dos EUA, em 30 de agosto de 1946.

Chuck Yeager serviu na USAF entre 1941 e 1975 (Domínio Público)
Chuck Yeager serviu na USAF entre 1941 e 1975 (Domínio Público)

Após a morte de Woolams, a Bell contratou Chalmers “Slick” Goodlin, piloto americano também ex-combatente na Segunda Guerra Mundial, mas pelo Canadá.

A cúpula americana, no entanto, não estava satisfeita com o andamento do projeto administrado pela NACA e exigia maior velocidade na apresentação dos resultados, algo que a Bell, por questões de segurança, se recusava a fazer. Citando o termo da aviação, a fabricante não queria acelerar o processo de “abertura dos envelopes de voo” previstos no cronograma: cada envelope do programa de testes de aeronaves tem um objetivo que deve ser ensaiado, avaliado e certificado.

Não só isso, Goodlin, com 26 voos registrados no XS-1 e ciente de que romper a barreira do som era uma questão de pouco tempo, pediu um prêmio de US$ 150.000 para quando atingisse o objetivo. Acabou afastado do projeto.

O comando do avião em forma de bala e renomeado pela USAF como X-1 foi passado desta vez para um militar na ativa, o major Chuck Yeager, piloto de testes da recém-criada Força Aérea dos Unidos (USAF), em agosto de 1947.

A era supersônica começava há sete décadas…

Glamourosa Glennis 

Considerados um dos melhores pilotos do mundo em sua época, Chuck Yeager havia participado da Segunda Guerra Mundial, de 1943 até o final do conflito em 1945. No comando de caças P-39 e P-51 Mustang, abateu 11 aeronaves da Alemanha: cinco delas derrubadas em apenas um dia e o primeiro abate registrado de um Me-262, o novíssimo caça com motor a jato que os alemães colocaram em combate nos últimos meses da guerra na Europa.

Exímio piloto e com muito conhecimento sobre os sistemas dos aviões, Yeager rapidamente se habituou ao velocíssimo X-1. Chamou o protótipo de “Glamorous Glennis“, em homenagem a sua esposa Glennis Yeager, repetindo o gesto que havia feito em seu vitorioso Mustang durante a Segunda Guerra Mundial.

Chuck Yeager prestes a embarcar na apertada cabine do Glamours Glennis (Domínio Público)
Chuck Yeager prestes a embarcar na apertada cabine do Glamours Glennis (Domínio Público)

O X-1 era um “avião-foguete”. O motor turbojato gerava 6.000 libras de empuxo, consumindo enormes quantidades de combustível. O avião era abastecido com um mistura de etanol, água e oxigênio líquido. A “bebedeira” era tanta, que o tempo de voo do aparelho com potência total era de apenas cinco minutos.

Para poupar o esforço de uma decolam, o X-1 era lançado em voo como uma bomba por um bombardeiro B-29 adaptado. Uma vez no ar e estabilizado, o piloto acionava o motor. Depois que os tanques de combustível secavam, o piloto conduzia o protótipo em voo planado para o pouso.

Como o alcance do X-1 era muito pequeno, o avião era lançado em voo do porão de um B-29 (Domínio Público)
Como o alcance do X-1 era muito pequeno, o avião era lançado em voo do porão de um B-29 (Domínio Público)

Os testes eram realizados na aeródromo do exército americano Pinecastle Army Airfield, na Florida, região onde foram escutados os primeiros “Sonic Boom”, o estrondo sônico causado por um objeto quebrando a barreira do som.

No dia 14 de outubro de 1947, com apenas 24 voo a bordo do X-1, Chuck Yeager alcançou Mach 1,06, algo em torno de 1.100 km/h a 12.000 metros. Em sua autobiografia (“Voando nas Alturas”, no título editado no Brasil), o piloto contou que realizou o primeiro voo supersônico com duas costelas quebradas, resultado de uma queda de cavala sofrida dois antes do voo.

“Percebi que, quanto mais rápido, mais macio se tornava o voo. Subitamente, o ponteiro Mach começou a oscilar. Cheguei a Mach 0.965 e o ponteiro ultrapassou o ponto máximo da escala. Pensei estar vendo coisas! Voávamos supersonicamente! E o voo estava macio como bundinha de nenê. Estava abismado. Depois de toda ansiedade por que passamos, o rompimento da barreira do som resultou numa coisa tão simples quanto dirigir numa pista de corridas muito bem pavimentada”, conta Yeager em sua autobiografia.

Uma vez no ar e com motores acionados, os tanques de combustível do X-1 secavam (Domínio Público)
Uma vez no ar e com motores acionados, os tanques de combustível do X-1 secavam (Domínio Público)

Yeager ainda voou mais 10 vezes no X-1 e conseguiu romper a barreira do som mais quatro vezes. Na mais rápida delas, em março de 1948, foi a Mach 1,45, cerca de 1.790 km/h. A maior marca do piloto também foi mais a alta de todo o programa, que seguiu até outubro de 1951. Ao todo, quatro protótipos construídos pela Bell realizaram 157 voos comandados por 18 pilotos.

Super-piloto

Depois de testar o X-1 em velocidade supersônica, Yeager voltou para o “batente” em esquadrões de combate, sua antiga casa. O piloto participou da primeira geração do aviões de combate a jato, com o F-86 Sabre, em 1949, ou até o soviético MiG-15 – Yeager foi o primeiro piloto americano a voar no caça da URSS. No início da década de 1950, já voou no primeiro fruto da pesquisa realizada com o X-1: o F-100 Super Sabre, o primeiro caça supersônico produzido em série.

No início da década de 1960, Chuck Yeager foi um dos pilotos indicados pela USAF para o programa espacial Gemini, que levou mais adiante ao desenvolvimento das missões Apollo que alcançaram a Lua. O lendário piloto, primeiro a voar na velocidade do som, acabou preterido da seleção por ser o único participante do grupo que não contava com curso superior.

Chuck Yeager deixou a USAF em 1975; mas isso não o impediu de voar no F-15... (chuckyeager.com)
Chuck Yeager deixou a USAF em 1975; mas isso não o impediu de voar no F-15… (chuckyeager.com)

Fora da turma que formou os primeiros astronautas da NASA, Yeager foi para a Guerra do Vietnã, em 1966, onde voou com o bombardeiro B-57 Canberra. Em dois anos no conflito, o experiente comandante somou mais de 400 horas de voo em combate e alcançou a patente máxima da USAF, de general brigadeiro.

O lendário piloto, que ainda participou do desenvolvimento de importantes caças dos EUA, como o F-104 Starfighter e o F-4 Phantom, deu baixa da USAF em 1975, após 34 anos de serviços com as forças armadas dos EUA, a maioria do tempo voando. Fora do serviço militar, Yeager continuou sempre envolvido com a comunidade aeronáutica, inclusive voltando a voar em caças modernos, em ocasiões comemorativas. Hoje, aos 94 anos, Chuck Yeager é dono de uma agitada conta no Twitter (@genchuckyeager) e um dos maiores nomes na história da aviação.

Veja mais: Jato executivo supersônico começa a ser testado nos EUA

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  1. Desculpem mas vou discordar da matéria, o primeiro vôo supersônico na verdade foi realizado por Heinz Dittmar, um piloto de testes da Luftwaffe, que apesar de ser ligado a Força Aérea, ele era civil
    Isso ocorreu em 17 de abril de 1944 com o avião Me 163, que ao contrário do “foguete” de Yeager, ele decolou com os próprios meios, enquanto o americano foi rebocado até a altitude programada. Dittmar teve seu vôo registrado tanto por radares como também por medidores no solo, alcançando a velocidade de 1122 km/h a uma altitude de cerca de 5800 metros.

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