Até algumas décadas atrás o número de países com indústrias capazes de construir jatos de combate mal enchia uma mão. Após a Segunda Guerra Mundial, o conhecimento de projetar e construir caças ficou basicamente concentrado em nações como os EUA, França, Reino Unido e a antiga União Soviética. Eram os anos da Guerra Fria e sua interminável corrida armamentista que levou ao desenvolvimento de aeronaves militares cada vez avançadas.
Esse tempo passou, mas os avanços continuaram. Não só isso, durante esse período nações emergentes realizaram grandes investimentos em tecnologia e também aprenderam a construir seus próprios jatos de guerra, como a China, Índia e Paquistão.
Nos próximos anos, esse grupo ainda terá a participação da Coreia do Sul e Turquia, países ainda novatos no desenvolvimento de caças, mas que têm projetos ambiciosos na área.
Nomes consagrados na aviação militar também estão projetando novos aviões de combate. Na Europa são duas propostas, o Tempest (consórcio entre Reino Unido, Itália e Suécia) e o programa FCAS (da Alemanha, França e Espanha). Outro caso é o Japão, que pretende retomar sua capacidade de produzir jatos de combate após um hiato de quase 40 anos.
E não podemos esquecer do Saab Gripen E/F, desenvolvido em parceria entre a Suécia e o Brasil, que logo fará parte do grupo de nações que constroem caças supersônicos.
Coreia do Sul
Primeira tentativa da Coreia do Sul em projetar e construir um jato avançado de combate, o projeto KF-X é conduzido pela Korea Aerospace Industries (KAI) com suporte da Lockheed Martin. O aparelho é classificado como um caça bimotor da geração 4,5 – um caça de 4ª geração com equipamentos de última geração. A Indonésia também colabora no projeto.
A primeira vista das maquetes e concepções artísticas, o caça coreano parece imitar os design do famoso F-22 Raptor, dos EUA. O modelo asiático, porém, não tem alguns dos componentes e qualidades que tornam o jato americano tão avançado, como os compartimentos de armamentos na fuselagem e motores com empuxo vetorial, além da capacidade stealth (“invisível” aos radares) comprovada.
A ideia original da KAI era construir um autêntico caça de 5ª geração, mas teve de limitar os requisitos. Em 2014, o governo dos EUA bloqueou a transferência de tecnologias vitais de fornecedores americanos para o jato coreano, que adotou uma configuração menos avançada. O projeto KF-X corre desde 2010.
O rollout da aeronave é prometido para este ano e o primeiro voo de teste, em 2022, com produção em série a partir de 2026. A força aérea da Coreia do Sul deve receber 120 aeronaves até 2032. Os jatos vão substituir os antigos caças KF-5 E/F (versão do F-5 E/F fabricado pela KAI) e F-4, em serviço no país há mais de 40 anos.
Turquia
Outro país iniciante na construção de caças, a Turquia está desenvolvendo o TF-X (Turkish Fighter – Experimental), caça bimotor stealth de superioridade aérea. O projeto está aos cuidados da Turkish Aerospace Industries, com colaboração da BAE Systems e Rolls-Royce.
A aeronave é planejada para substituir os F-16 da Força Aérea Turca e também para exportação. O primeiro voo do caça está programado para 2023, ano em que será celebrado o centenário da República Turca, com entrada em serviço em meados de 2028.
O programa foi oficializado pelos governo turco em 2010 e no ano seguinte a TAI iniciou o projeto sobre os requisitos da aeronave. Concluídos os estudos, a equipe de desenvolvimento apresentou o formato final, um caça de 5º geração completo.
O Turkish Fighter promete seguir a receita dos caças 5ª geração a risca. Isso inclui ter alta manobrabilidade, radar e sensores de longo alcance, compartimentos internos de armamento e o design que o torna “invisível” aos radares. Não à toa, parece mais um “clone” do F-22. De acordo com a TAI, o caça poderá voar a Mach 1.8 (2.222 km/h) – incluindo a capacidade de cruzeiro supersônico – com alcance de combate na faixa dos 1.200 km.
Nos últimos anos, as forças armadas turcas receberam importantes investimentos e o país tem investido pesado na produção local de equipamentos. Considerado um dos projetos mais ambiciosos da categoria, o TF-X pode ocupar uma posição de destaque na defesa local e se tornar um valioso produto de exportação.
Japão
Após a Segunda Guerra Mundial, o setor aeroespacial e de defesa do Japão foi esmagado, forçando o país a entrar em um longo período de reconstrução. Como resultado, os japoneses passaram as últimas décadas construindo sob licença caças projetados dos EUA, como o F-15 Eagle e o F-16, aeronaves que até hoje formam a espinha dorsal da chamada “Força Aérea de Autodefesa do Japão” – um força aérea focada em defesa e não no ataque.
Com o aumento das tensões na Ásia, o Japão vem alterando o perfil de suas forças armadas, que devem ser capazes de efetuar contra-ataques e não apenas se defender. A ponta de lança desse novo modelo operacional será o caça criado a partir do programa F-X.
O projeto foi formalizado pelo governo japonês no final de 2019 e grupo Mitsubishi Heavy Industries (MHI) foi selecionado para liderar o projeto. Outras empresas japonesas envolvidas no programa são a Subaru, Toshiba e Fujitsu, além da norte-americana Lockheed Martin. No passado, algumas dessas mesmas companhias trabalharam em conjunto na produção do Mitsubishi F1, caça supersônico produzido no Japão entre 1975 e 1986.
De acordo com os requisitos do projeto, o F-X deve ser jato militar multifuncional, capaz de atacar alvos terrestres e marítimos, bem como participar de combates aéreos. Ele terá tecnologia stealth, além de equipamentos de guerra eletrônica e sensores à prova de interferências. Também é previsto o uso de sistemas de inteligência artificial e comandos autônomos. Ao incorporar todos esses recursos, os japoneses terão nas mãos um dos primeiros caças de 6ª geração do mundo.
Embora tenha sido oficializado recentemente, o programa F-X é um assunto antigo no Japão. A ideia surgiu no final dos 1990, quando os EUA proibiram as exportação do F-22 ao país. A partir da recusa dos americanos, o ministério da defesa japonês iniciou uma série de estudos sobre a viabilidade de produzir localmente um novo jato de combate e até criou um “rascunho” do projeto, o demonstrador de tecnologia Mitsubishi X-2 Shinshin, testado entre 2016 e 2018.
O Japão planeja fabricar cerca de 90 caças do programa F-X, que sucederão o antigo Mitsubishi F-2 (versão local do Lockheed Martin F-16), com implantação prevista para 2035. A mídia japonesa já cunhou até um apelido para o novo jato: “Godzilla”.
China
Depois dos EUA, a China foi o segundo país a colocar em serviço um caça de 5ª geração, o Chengdu J-20 “Wēilóng” (Poderoso Dragão, em mandarim). O jato chinês fez seu voo inaugural em 11 de janeiro de 2011 e sua introdução começou em 2017. Estima-se que cerca de 50 exemplares do jato estão em serviço na força aérea chinesa.
O J-20 como conhecemos hoje é o resultado final do programa J-XX, iniciado no final dos anos 1990 e no qual competiram as fabricantes Chengdu Aerospace Corporation e Shenyang Aircraft Corporation, embora as duas marcas sejam subsidiárias do grupo estatal AVIC. Em 2008, o governo chinês escolheu a proposta da Chengdu.
Há quem considere o J-20 uma imitação de projetos do Ocidente e um avião de capacidades duvidosas. No entanto, especialistas apontam que o jato chinês tem um enorme potencial e surge como o único rival a altura das capacidades do F-22. A Chengdu também está desenvolvendo uma versão biposto do caça, proposto para missões de bombardeio tático, guerra eletrônica e “matador” de porta-aviões.
Além de criar um oponente para o F-22, os chineses também estão projetando uma resposta ao Lockheed Martin F-35 Lightning II, o Shenyang FC-31. A aeronave começou a ser testada em 2012, mas seu propósito ainda não é claro. Analistas acreditam que o jato pode ser adotado pela marinha chinesa e empregado nos novos porta-aviões que estão em construção do país, mas o governo chinês ainda diz quando o avião deve estrear.
Rússia
País com uma soberba capacidade de produzir aeronaves de combate, a Rússia herdou da antiga União Soviética alguns dos caças mais espetaculares do mundo. O país, contudo, demorou a avançar para a 5ª geração e somente do ano passado iniciou a produção em série de primeiro jato nessa categoria, o Sukhoi Su-57.
A aeronave é o produto final do programa PAK FA (sigla em russo para “Complexo Prospectivo Aeronáutico da Aviação de Linha de Frente”), iniciado em 2002 para criar um sucessor para a dupla MiG-29 e Su-27 na força aérea russa. O primeiro voo do Su-57 ocorreu em 29 de janeiro de 2010 e as primeiras unidades entraram em serviço no final do ano passado.
O jato russo é considerado o quarto caça de 5ª geração do mundo, depois do F-22, F-35 e o J-20. De acordo com a Sukhoi, o Su-57 é supermanobrável, alcança Mach 2, carrega armas hipersônicas e possui design stealth, embora especialistas questionem a “invisibilidade” e as capacidades de combate da aeronave, que ainda usa uma série de sistemas empregados em jatos mais antigos.
Os russos também iniciaram os primeiros movimentos para desenvolver um caça de 6ª geração, desta vez para substituir a frota de MiG-31, o caça mais rápido da atualidade (capaz de passar dos 3.000 km/h). O programa é conhecido como PAK DP (Prospecção de complexo aéreo para interceptação de longo alcance) e pode dar origem ao MiG-41.
Índia
Sonho antigo dos indianos, o HAL Tejas (Brilho, em hindu) levou mais de 20 anos para sair do papel e se tornar realidade. No final da década de 1980, a Índia formou o comitê responsável por definir os requisitos do caça de acordo com infraestrutura do país, que tinha uma atuação tímida na construção de aviões.
Classificado como um caça multimissão de 4ª geração, o Tejas é o primeiro avião supersônico projetado na Índia. O voo inaugural aconteceu em 4 de janeiro de 2001, mas ele entrou em serviço somente 15 anos depois.
Ao contrário de outros projetos iniciantes, o jato indiano possui uma grande quantidade de componentes produzidos localmente, como as estruturas de material composto e até os sistemas de controle eletrônico (fly-by-wire), tecnologias que poucos países dominam. Segundo a Hindustan Aeronautics Limited (HAL), cerca de 70% do conteúdo do caça é produzido na Índia.
No entanto, o Tejas tem um desempenho bastante modesto comparado a caças do Ocidente: atinge velocidade máxima de Mach 1.6 (1.850 km/h) e o alcance de combate não passa de 500 km (mesmo com dois tanques de combustível externos). Apesar disso, o projeto trouxe importantes aprendizados e avanços em diversas áreas para os indianos, como o desenvolvimento local de armamentos, como o míssil de cruzeiro BrahMos, um dos mais letais do mercado militar.
A força aérea da Índia tem atualmente 40 jatos Tejas em serviço em dois esquadrões. Recentemente, o governo do país anunciou a compra de mais 83 aparelhos. A HAL também está trabalhando numa versão atualizada da aeronaves, o Tejas MK-2, e um modelo adaptado para operações em porta-aviões com convés do tipo ski-jump (sem catapultas de lançamento).
Paquistão
Rival histórico da Índia, o Paquistão também capacitou sua indústria para produzir caças. A aeronave de combate produzida no país é o JF-17 Thunder, desenvolvido pela Pakistan Aeronautical Complex (PAC) em parceria com a chinesa Chengdu.
O JF-17 foi concebido para atender aos requisitos da Força Aérea do Paquistão, que pedia uma aeronave multifuncional, moderno e de baixo custo para substituir os antigos caças Mirage III/5 e Chengdu F-7 (versão chinesa do MiG-21).
A produção do primeiro protótipo começou em setembro de 2002 e no ano seguinte o avião já estava voando – e três anos depois em serviço no Paquistão. O orçamento do projeto foi limitado em US$ 500 milhões (dividido igualmente entre China e Paquistão), um valor irrisório comparado ao de projetos mais avançados.
Os fabricantes descrevem o JF-17 como um caça monomotor de 4ª geração. Recentemente, a Força Aérea do Paquistão recebeu os primeiros modelos da versão Block 3,equipado com um novo painel digital, motor mais potente, radar de maior alcance, entre outros itens. Com essa atualização, os paquistaneses agora oferecem o “Thunder” como um caça da geração 4,5.
Cada JF-17 tem um preços estimado entre US$ 18 milhões e US$ 35 milhões, o que provavelmente o torna o caça mais barato do mundo em produção atualmente. Mais de 130 jatos estão em serviço no Paquistão e o modelo também foi comprado pelas forças aéreas de Myanmar e da Nigéria – a China não comprou nenhum.
A lista de armamentos do JF-17 incluem essencialmente mísseis e bombas de origem chinesa e artefatos mais antigos, de fornecedores dos EUA. Outra arma no leque do Thunder é o míssil antirradiação MAR-1, fabricado pela SIATT (ex-Mectron) no Brasil.
Europa
Acostumados a agir em bloco, países na Europa também estão planejando reequipar suas forças armadas com aeronaves de última geração. No momento há duas frentes em desenvolvimento, o projeto Tempest (entre Reino Unido, Itália e Suécia) e o FCAS (Alemanha, França e Espanha). Ambas iniciativas visam a construção de caças de 6ª geração, com entrada em serviço em meados da década de 2030.
O programa Tempest reúne as fabricantes BAE Systems, SAAB e a Leonardo. Se for adiante neste formato, o produto final pode ser um substituto para os caças Eurofighter Typhoon, em serviço no Reino Unido e Itália, e o Gripen, na Suécia. Já o grupo FCAS envolve, por hora, a Airbus e a Dassault, que também propõe um sucessor para o Typhoon (na Alemanha e Espanha) e o francês Rafale.
Estados Unidos
País com o maior arsenal militar do mundo, os Estados Unidos não baixam a guarda em nenhum momento. O caça mais avançado do país, o F-22 Raptor deve ser submetido em breve ao seu primeiro processo de modernização. O programa é chamado de ARES, acrônimo em inglês Aprimoramento Avançado e Sustentação do Raptor. A sigla também é uma referência a divindade Ares da mitologia grega, o deus da guerra.
As forças armadas dos EUA também são os maiores operadores do F-35, que diferentemente do F-22 é um projeto compartilhado entre diversas nações. O país é o único do consórcio que comprou as três versões da aeronave (os modelos F-35A, F-35B e F-35C), que estão assumindo os postos de caças como o F-16 e o AV-8B Harrier II.
Os americanos também seguem investindo no F-15 Eagle, um projeto que já tem quase 50 anos. Em 2019, a Boeing foi contratada pela força aérea dos EUA (USAF) para desenvolver o F-15X, que prevê uma atualização radical na aeronave.
Mas algo totalmente novo também está nos planos do Pentágono. No ano passado, Will Roper, Secretário Adjunto da USAF, confirmou que um novo jato de combate já está em fase de testes de voo no país. O projeto, contudo, ainda é um segredo militar.
Segundo o secretário da USAF, o avião de demonstração é um esforço do programa Next Generation Air Dominance (NGAD), iniciado em outubro de 2019 e que futuramente pode originar o primeiro caça de 6ª geração dos EUA.
Brasil-Suécia
Fechando a lista, é importante mencionar o Gripen E/F, nova versão do caça da SAAB que está sendo desenvolvida em parceria com empresas brasileira, entre elas a Embraer. Trata-se do primeiro projeto de avião de combate supersônico conduzido por uma nação da América Latina, fato proporcionado pela transferência de tecnologia da empresa sueca para o Brasil.
A Força Aérea Brasileira encomendou um total de 36 caças Gripen nas versões E (monoposto) e F (biposto). O primeiro exemplar de testes chegou ao país em 2019 e neste ano é esperada a chegada dos primeiros modelos operacionais, importados da Suécia. Mais adiante, serão entregues os aparelhos fabricados no Brasil.
O Gripen E/F é um caça da geração 4,5 – uma evolução do Gripen C/D, de 4ª geração. Para a FAB, que há tempos não conta caças Mach 2 e opera atualmente os antigos F-5, o jato sueco será um enorme avanço em termos tecnológicos e de desempenho. Não só isso, é uma aeronave de baixo custo operacional, o que deve facilitar seu emprego no Brasil.
Colocar o Grippen E/F como “Brasil – Suécia” (e fazendo questão de colocar o Brasil antes da Suécia) é forçar um pouco demais a barra, não acham?
O Grippen é um produto sueco de origem, já desenvolvido há bastante tempo. As contribuições do Brasil à nova versão são mínimas e de baixa relevância se formos ver o projeto como um todo.
É a mesma coisa que alguém fazer um bolo, aí você vai lá e coloca a cereja no bolo e diz pra todo mundo que você também “fez” ele…
Vamos com calma com o ufanismo e vamos respeitar os suecos, que fizeram quase todo o trabalho sozinhos, né? Não estamos com essa bola toda.