Porta-aviões são máquinas impressionantes. Podem viajar pelo mundo todo carregando uma força aérea debaixo de seus enormes conveses, que são pistas curtíssimas adaptadas para lançar e receber aviões com o balanço do mar. Para os pilotos, é um dos trabalhos mais difíceis do mundo, exigindo extrema perícia nos controles e tomadas de decisões. E, como se já não fosse complexo o suficiente pousar em navios, esse conceito também foi testado nos céus, no balanço do ar.
O porta-aviões voador, porém, era bem diferente dos que aparecem nos filmes da série “Os Vingadores” (um dia chegamos lá!). Em 1926, a Marinha dos Estados Unidos (US Navy) requisitou dois dirigíveis de escolta de longo alcance, para acompanhar embarcações militares e civis em travessias oceânicas. Mas o pedido ainda tinha mais um detalhe: eles deveriam ser capazes de carregar aviões e ter condições de operá-los.
A Inglaterra já havia testado parte dessa ideia durante a Primeira Guerra Mundial, quando adaptou alguns de seus dirigíveis de observação para carregar caças de proteção. As aeronaves,porém, não podiam voltar e uma vez lançadas deveriam depois pousar em solo. A proposta do US Navy queria completar o projeto, criando uma forma de recuperar os aviões.
A requisição do US Navy foi atendido pela “Goodyear-Zeppelin Corporation”, uma empresa criada pela combinação da fabricante norte-americana de pneus Goodyear e a Zeppelin, da Alemanha, que compartilhou seu conhecimento sobre dirigíveis de grande porte com os americanos. A construção dos aparelhos começaram em 1928 e terminou apenas em 1931, quando finalmente voaram os “gêmeos” USS Akron e USS Macon.
Mas em vez de pistas, uma vez que seria um tanto perigoso operar aviões sobre dirigíveis, foi proposto lançar e “capturar” as aeronaves pela parte de baixo dos enormes aparelhos. Dentro de cada dirigível havia um hangar para até 10 aviões e uma torre móvel de lançamento e engate, que mais adiante os pilotos chamariam de “trapézio”.
Parasitas
O avião de proteção e ataque escolhido para acompanhar a dupla Akron e Macon foi o biplano Curtiss F9C-2 ‘Sparrowhawk’, um “caça-parasita”. Para lançar o avião, uma porta era aberta na parte de baixo do dirigível e em seguida ele era colocado para fora segurado por dois suportes com cabos. Para “decolar” bastava soltar a aeronave e com a queda e aceleração ela ganhava sustentação e voava. Para voltar a “base”, era preciso conectar o biplano ao trapézio por um gancho, uma manobra de muita precisão.
Não só pela dificuldade de conectar o caça ao dirigível, o piloto do avião também precisava acompanhar o ritmo lento de aceleração do balão motorizado. Os dirigíveis do US Navy eram impulsionados, cada um, por oito motores alemães V12 ‘Maybach’ de 560 cv. Apesar de toda essa cavalaria alemã, os aparelhos alcançam no máximo 139 km/h.
Os exercícios com os aviões começaram em 1932, a princípio com biplanos de treinamento Consolidated N2Y e Waco UBF XJW-1, mais leves e com dois assentos. A operação era delicada e o piloto raramente conseguia conectar o avião ao trapézio na primeira tentativa. Em todas as fotos antigas que mostram o procedimento é curioso observar a cabeça dos pilotos sempre inclinada para cima, mirando a barra do trapézio.
As operações foram iniciadas primeiro com o Akron, que estreou em janeiro de 1932. Os procedimentos de lançamento e recuperação das aeronaves sempre foram realizadas com segurança e nenhum acidente foi registrado. O problema era a operação com os dirigíveis.
Enormes, pesados e frágeis, os dirigíveis do passado nunca conseguiram passar incólumes do perigo – o famoso acidente do Zeppelin Hindenburg foi apenas um dos capítulos trágicos dessas máquinas. Em pouco mais de um ano, o USS Akron sofreu quatro acidentes até ser perdido na costa da Nova Inglaterra, em 3 abril de 1933, e o Macon ficou irrecuperável após um acidente na costa da Califórnia, em 26 de fevereiro de 1935.
Após a breve carreira dos dirigíveis porta-aviões dos EUA, o conceito foi abandonado. Logo em seguida os enormes aerostatos também começaram a sair de cena com o surgimento de novos aviões, que podiam cobrir grandes distâncias em velocidades mais altas e, sobretudo, com segurança.
Aviões “porta-aviões”
Além de dirigíveis, os caças-parasitas também já voaram “agarrados” a outros aviões. Os primeiros a realizarem essa proeza foram os soviéticos, com o projeto “Zveno”. Trata-se de uma combinação do bombardeiro Tupolev TB-1 a até cinco caças Polikarpov I-16, que serviam de proteção contra caças inimigos ou para atacar objetivos mais a frente. O “medonho” avião com parasitas da União Soviética foi utilizado em combate com sucesso contra a Romênia, em 1931. Após essa curta experiência, os parasitas voltariam somente no final da década de 1940.
Após a Segunda Guerra Mundial, os EUA iniciaram um intenso processo de desenvolvimento de novas tecnologias e formas de utilizar os aviões. Em 1948, a Força Aérea dos EUA (USAF) testou o protótipo com motor a jato XF-85 ‘Goblin’, projetado pela McDonell Aircraft para ser lançado e recuperado a partir de um bombardeiro Boeing B-29 modificado.
O Goblin foi desenhado para caber no porão de bombas do B-29. Para voar, o avião era liberado como um bomba. A recuperação, porém, era mais complicada. Um longo trapézio móvel descia do bombardeiro e o piloto do caça manobrava até encontrar o ponto de engate. Feito o contato, o suporte com a aeronave era elevado de volta para o porão.
A plano da USAF com o Goblin era fornecer uma proteção imediata a uma formação de bombardeiros contra caças inimigos. Os B-29 com os caças-parasitas voariam entre os aviões carregando bombas. O projeto, no entanto, foi cancelado após um ano, devido a obsolência do veterano bombardeiro, usado na Segunda Guerra Mundial, e por sorte sem acidentes.
Projeto FICON
O enorme bombardeiro Convair B-36, que entrou no lugar do B-29, também teve seu caça de “estimação”. Em 1952, a USAF testou o primeiro protótipo do projeto FICON (Fighter Conveyor – Caça Transportado), um B-36 com um caça-parasita Republic F-84 Thunderjet.
O lançamento e recuperação do avião seguia os mesmo procedimentos utilizados no B-29 e o Goblin, com uma torre de engate no porão de bombas. Além dessa técnica, a USAF também adaptou os modelos B-29 e B-36 para carregar os caças F-84 nas pontas das asas, nos projetos” Tom-Tom” e “Tip-Tow”, também realizados na década de 1950.
As aeronaves do projeto FICON entraram em operação em 1955 e 10 bombardeiro B-36 foram adaptados (GRB-36D) e 25 caças F-84 (RF-84K) foram preparados para a nova função “parasita”. A dupla era um meio de observação de longo alcance e até mesmo o caça podia ser equipado com aparelhos de espionagem. Outra possibilidade ainda previa o lançamentos de bombas nucleares táticas na URSS a partir do caça-parasita, que depois poderia voltar a “nave-mãe”. Após um ano, com os primeiros testes do eficiente avião espião Lockheed U-2, a combinação perdeu o sentido e o esquadrão foi desativado.
O projeto FICON foi a última experiência com o que se pode chamar de “porta-aviões voadores”. Com os recursos avançados de reabastecimento em voo, aeronaves podem estender seu alcance sem a necessidade de ser literalmente carregado por outro avião, como aconteceu no passado. Além disso, muitos desses aviões militares atualmente também têm condições de se defenderem sozinhos.
Portanto, os porta-aviões ainda devem permanecer durante um bom tempo somente no mar.
Veja mais: Conheça os diferentes tipos de porta-aviões
Que irado!!!!!Bela matéria,valeu!
Valeu mesmo! Pensei que aquele aviãozinho pendurado no dirigível no filme “Indiana Jones e a Última Cruzada” fosse só uma armação mentirosa e descarada do roteirista!
Só gostaria de corrigir duas coisas:
primeiro, creio que, expressões que no idioma original não têm gênero, como “U.S. Navy”, adotam em português aquele da sua tradução. Assim, seria “a U.S. Navy” em vez de “o”; e, em segundo, a tradução de “Fighter Conveyor” seria “Transportador de Caças”, e não “caça transportado”.
No mais, ótima matéria. Parabéns!