Prestes a completar um ano, o acidente com o Boeing 737 MAX 8 da Lion Air ganhou novas revelações nesta sexta-feira (25). O comitê de investigadores de acidentes aéreos da Indonésia divulgou seu relatório final sobre a queda da aeronave, em 29 de outubro de 2018, no Mar de Java. Um documento com 322 páginas elaborado pelo grupo aponta que falhas da Boeing, da companhia aérea e dos pilotos causaram o desastre que deixou 189 mortos.
“Pelo que sabemos, há nove coisas que contribuíram para este acidente. Se um dos nove tivesse sido evitado, talvez o acidente não tivesse acontecido”, disse o investigador de acidentes aéreos indonésio Nurcahyo Utomo em entrevista coletiva.
Cinco meses após o acidente com o jato da Lion Air, um avião igual da Ethiopian Airlines caiu próximo a Adis Abeba, na Etiópia, matando todos os 157 ocupantes a bordo, o que levou a paralisação mundial dos 737 MAX.
O relatório aponta que o jato deveria ter sido aterrado pela Lion Air antes dele partir para seu voo fatal por conta de um problema anterior no cockpit. Porém, como o problema não foi registrado adequadamente pelas equipes da companhia, o avião foi autorizado a decolar sem que a falha fosse corrigida, diz o comunicado das autoridades indonésias.
Outro ponto importante, um sensor crucial, adquirido de uma empresa da Flórida, não havia sido testado corretamente pela Boeing, segundo o relatório. Além disso, era um sistema único, sem redundância.
Esse sensor forneceu informações ao Sistema de Aumento de Características de Manobra do avião, o MCAS. O mal funcionamento desse software tem sido o foco dos investigadores para encontrar a causa dos acidentes da Lion Air e Ethiopian Airlines.
O MCAS é um sistema de controle de voo 737 MAX que tenta imitar o comportamento do 737 NG. O programa ajusta o estabilizador horizontal para abaixar o nariz da aeronave quando é detectada uma possível situação de estol aerodinâmico (perda de sustentação), com base nos dados dos sensores de velocidade do ar, altitude e ângulo de ataque da aeronave.
Peritos da Indonésia identificaram problemas com o sistema, que empurrou repetidamente o nariz do avião da Lion Air enquanto os pilotos tentavam recuperar o controle. Situações como essa também são citadas na investigação sobre o acidente com o 737 MAX da Ethiopian Airlines.
O relatório ainda constatou que o co-piloto, no momento em que assumiu o comando da aeronave, teve dificuldade para executar uma lista de procedimentos que ele deveria ter memorizado.
O documento finalizado também confirmou que estavam faltando 31 páginas no registro de manutenção do avião. Anteriormente, autoridades da Indonésia já haviam alertado que problemas de design e falhas mecânicas eram fatores chave na queda do JT610.
Ex-CEO e agora diretor executivo da Boeing, Dennis Muilenburg afirmou que houve uma sequência de eventos que resultaram no acidente da Lion Air. Mas o centro dessa cadeia era o MCAS, um sistema de controle que os pilotos desconheciam e vulnerável a uma única falha no sensor.
A conclusão das autoridades da Indonésia indica falhas graves nas operações das Lion Air, mas também sugere que a Boeing e os órgãos reguladores que certificaram o 737 MAX permitiram que o sistema de controle defeituoso fosse projetado dessa maneira.
E a Boeing?
Em comunicado divulgado nesta sexta-feira, a Boeing disse que está atendendo as recomendações do comitê de investigação da Indonésia, que pede a reformulação do MCAS e o fornecimento de informações adequadas em manuais e treinamento de pilotos.
A fabricante disse que está “tomando medida para a melhorar a segurança do 737 MAX para impedir que as condições de controle de voo ocorridas neste acidente (da Lion Air) voltassem a acontecer”.
“Desde esse acidente, o 737 MAX e seu software estão passando por um nível sem precedentes de supervisão regulatória global, testes e análises. Isso inclui centenas de sessões de simulador e vôos de teste, análise regulatória de milhares de documentos, análises de reguladores e especialistas independentes e extensos requisitos de certificação”, diz o informe da fabricante.
A pressão para a Boeing explicar os problemas com o 737 MAX vem se intensificando. Neste mês, um documento da companhia revelou que pilotos do programa MAX haviam trocado mensagens sobres as falhas no MCAS enquanto o avião estava sendo certificado em 2016 e o defeito não foi comunicado ao FAA (agência de aviação civil dos EUA) – a série MAX estreou em maio de 2017.
A Boeing informa que já tem uma versão corrigida do MCAS e sensores para o 737 MAX e que está “trabalhando com o FAA e outras agências reguladoras em todo o mundo na certificação do programa de atualização e treinamento de software” para devolver a aeronave com segurança ao mercado.
O retorno do 737 MAX ainda é incerto e não tem uma data cravada, embora a Boeing já tenha salientado que deve ter o avião liberado até o final deste ano. O novo processo de certificação do MAX vem causando pontos de discórdia entre o FAA e a EASA, a agência de aviação civil da Europa, que pretende fazer um processo de certificação separado e com outros requisitos.
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