Prestes a completar 86 anos de existência no dia 1º de fevereiro, a South African Airways passa pela fase mais delicada de sua longa carreira. A companhia aérea estatal da África do Sul estaria perto do colapso, segundo a imprensa do país. A razão é que ela acumula dívidas bilionárias há vários anos e o governo já não planeja mais salvá-la de uma possível falência. Evidências de que o fim pode estar próximo não faltam: os funcionários fizeram uma greve barulhenta em novembro por falta de pagamento de salários, a companhia acaba de colocar à venda seus velhos A340 e também anunciou o fim dos voos entre Joanesburgo e Munique, na Alemanha.
Mas, apesar disso, a SAA, como também é conhecida, tem negado qualquer problema. “A South African Airways (SAA) deseja garantir a seus clientes e partes interessadas que os voos para todos os seus destinos continuam normais. A companhia aérea está ciente dos relatos da mídia sugerindo que ela interromperá as operações. A SAA está sempre comprometida em se comunicar de forma transparente com todas as partes interessadas, incluindo clientes, sobre quaisquer mudanças operacionais significativas que possam afetar os horários dos voos. Onde houver alterações no cronograma de voos, essas mudanças operacionais serão gerenciadas e comunicadas de acordo com as normas e práticas do setor”, explicou uma nota publicada pela empresa na segunda-feira.
No entanto, nesta terça-feira (21), a companhia aérea anunciou vários cancelamentos de voos locais, parte deles operada pela subsidiária Mango. O argumento é que essas rotas têm baixa demanda. Por ser parceira da Star Alliance, a SAA está acomodando passageiros de voos para Munique em voos de outras companhias além de suas rotas para Londres e Frankfurt. Segundo relatos, a SAA teria acumulado perdas de mais de R$ 8 bilhões nos últimos 13 anos – a empresa não publica balanços desde 2017 quando teve quase R$ 800 milhões de prejuízo.
O governo do país tem procurado uma solução para reverter a situação da companhia, porém, não pretende continuar colocando recursos sem que exista um plano de recuperar sua saúde financeira. A SAA teve um presidente escolhido para tirá-la do buraco afastado no ano passado e declarou que seu “trabalho era constantemente minado”.
A frota de 50 aviões da SAA é formada por modelos antigos, quase todos eles da Airbus, e que têm uma média de idade de quase 11 anos. No final do ano passado, a South African decidiu fazer o leasing de quatro A350-900 na esperança de reduzir os custos de operação dos quadrimotores A340 e que hoje estão deixando de ser usados no mundo todo. Na semana passada, a empresa colocou nove desses A340, incluindo a versão -600, de maior capacidade, à venda juntamente com 15 motores de reserva e quatro APUs, unidades de potência auxilar. A ideia é que os interessados realizem lances para arrematar o pacote até 30 de janeiro.
Concorrência da LATAM nos voos para o Brasil
A South African é uma das mais antigas companhias aéreas estrangeiras a voar para o Brasil, inicialmente para o Rio de Janeiro. Atualmente, a companhia mantém um voo diário para Guarulhos e que em 2019 manteve uma taxa ocupação razoavelmente boa de 73%. Desde 2016, no entanto, a SAA ganhou a concorrência da LATAM na rota e que decidiu escalar seus A350-900 em agosto do ano passado.
O resultado dessa ofensiva é que a LATAM quase transportou o mesmo número de passageiros que a rival sul-africana. Foram 122 mil passageiros contra 124 mil da SAA, porém, o aproveitamento da LATAM foi bem superior, da ordem de 82% de ocupação em seus voos, segundo dados da ANAC. Em dezembro, por exemplo, essa virada ficou bastante nítida, com a companhia sul-americana transportando 13.281 passageiros contra 11.297 da South African – a empresa utiliza os Airbus A330 na rota entre Joanesburgo e São Paulo.
A situação da South African Airways tem evidenciado a obsolescência das companhias aéreas estatais pelo mundo. Sem o protecionismo de seus governos, que concedem privilégios de exploração dos mercados além de cobrirem possíveis déficits, essas empresas simplesmente não conseguem competir em um mercado que hoje é muito mais agressivo do que décadas atrás, quando era comum o domínios de companhias aéreas controladas pelo estado.
A SAA, inclusive, não está sozinha nessa agonia. A Alitalia, como se sabe, é outra empresa aérea problemática há muitos anos e sem solução aparente. Os indianos também arcam com a deficitária Air India enquanto nossos vizinhos mantêm a Aerolíneas Argentinas dominante em um mercado que teve apenas um curto período de abertura nos últimos anos.
Nesse sentido, o Brasil é hoje um mercado onde não existem empresas estatais, felizmente. Embora a Varig tenha vivido uma “união estável” com o governo federal, que a protegia de concorrência, e a Vasp tenha sido uma estatal do governo de São Paulo, essas companhias sobreviveram pouco tempo assim que o mercado teve uma pequena abertura. Espera-se que isso continue a ocorrer para não testemunharmos uma situação triste como o da South African Airways.
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