Voando no Bandeirante da FAB

Quente como um forno e com bancos desconfortáveis, voar no Bandeirante é uma experiência sensacional (e estou falando sério!)
Voando de Bandeirante sobre a Restinga de Marambaia, no RJ (Thiago Vinholes)
Voando de Bandeirante sobre a Restinga de Marambaia, no RJ (Thiago Vinholes)
Voando de Bandeirante sobre a Restinga de Marambaia, no RJ (Thiago Vinholes)
Voando de Bandeirante da Aeronáutica sobre a Restinga de Marambaia, no RJ (Thiago Vinholes)

Recentemente posso dizer que ganhei um bilhete premiado. A Força Aérea Brasileira (FAB), gentilmente, convidou o Airway para os festejos dos 80 anos do hangar do Zeppelin na Base Aérea de Santa Cruz (BASC), no Rio de Janeiro, e como a nossa “base-redação” fica em São Paulo, de lambuja ainda ganhamos uma carona de avião militar, no Embraer C-95 Bandeirante.

O voo foi programado para às 12h00 de um sábado, na Base Aérea de São Paulo (BASP), que fica do outro lado do Aeroporto Internacional de Guarulhos. Era um dia muito quente, com a temperatura passando dos 30°, daqueles que exige o uso de bermuda. Faria a viagem com a turma da banda No Quarter, um dos maiores covers do Led Zeppelin no Brasil. E, como eu, eles também chegaram à BASP vestindo bermudas. Mas nós não sabíamos: em avião de transporte militar só é permitido voar vestindo calças… E lá fomos nós trocar de roupa.

Enquanto o avião era abastecido e carregado com os instrumentos musicais da banda, a tripulação do C-95 nos explicou os procedimentos de segurança no caso de emergência e como nos acomodar na aeronave, que estava equipada somente com pequenos bancos laterais. Terminada a explicação, era hora de embarcar no “Bandeco”.

Não me lembro de alguma outra vez na vida ter sentido tanto calor, nem nas praias da Bahia ou uma vez que fui ao deserto do Saara. “Tem ar condicionado, mas ele não é tão forte”, nos avisou o piloto. “Está quente só aqui embaixo, lá em cima fica bem fresquinho”, contou o capitão, que inexplicavelmente parecia confortável em seu macacão de mangas compridas. Enquanto isso, o suor já escorria até pelas minhas canelas.

Como a maioria dos aviões com dois motores turbo-hélice, o Bandeirante começou o taxiamento usando somente a força de um motor, o que já o suficiente para fazer uma barulheira incrível na cabine, que praticamente não tem isolamento acústico. Chegando próximo à cabeceira da pista, o segundo motor foi acionado e dá-lhe mais barulho.

Olha o passarinho! O interior do Bandeirante é quente e barulhento, mas a viagem é muito divertida (Daniel Labó)
Olha o passarinho! O interior do Bandeirante é quente e barulhento, mas a viagem é muito divertida (Daniel Labó)

Depois que um Boeing 737 da Gol pousou bem na nossa frente, o Bandeirante entrou na pista e partiu para a corrida de decolagem. Como o avião estava leve, a subida foi rápida. Outra parte interessante era observar os celulares com sinal no máximo, mesmo já bem alto. Teve um que até tocou…a FAB não exige “modo avião” em voos do C-95.

Voo incrível

O calor na cabine era tanto que torcíamos para o avião alcançar a altitude de cruzeiro, algo em torno de 5.000 metros de altitude, o que é bem mais baixo que a faixa onde os jatos voam (em torno de 10 mil metros, dependendo da rota e aeronave). Chegando lá no alto, o “derretimento” corporal terminou. Agora era o momento de observar a paisagem espetacular voando abaixo das nuvens, passando pelo litoral norte de São Paulo e depois pela Restinga de Marambaia e a Ilha Grande, ambas no estado do RJ, normalmente difíceis de visualizar a partir das janelas de aviões comerciais.

Os militares da FAB estão tão acostumados, que parecem não sentir calor, mesmo de macacão (Thiago Vinholes)
Os militares da FAB estão tão acostumados, que parecem não sentir calor… (Thiago Vinholes)

O Bandeirante alcança velocidade máxima de 430 km/h, mas no voo de cruzeiro a aeronave da FAB opera na faixa dos 350 km/h. O céu estava limpo, por isso a aeronave não balançou em nenhum momento durante a viagem. Outro ponto a nosso favor era a perícia dos pilotos da Aeronáutica, que conduziam a aeronave com extrema destreza. Apesar da cabine do C-95 não ser pressurizada, ninguém a bordo sofreu com a altitude durante a viagem.

Na aproximação de Santa Cruz, o Bandeirante sobrevoou a base carioca, inclusive pelo enorme hangar do Zeppelin, e continuou seguindo em frente para somente mais adiante fazer uma curva e alinhar com a pista. Na descida, o co-piloto da aeronave e o mecânico de voo olhavam freneticamente pelas janelas. Estariam eles em busca de urubus? Nada disso! A torre de controle da BASC avisou que havia um sujeito voando de parapente, sem autorização, próximo a rota do avião e que era prudente evitá-lo.

No momento do pouso, a tripulação novamente provou seu valor. O toque do Bandeirante no solo foi muito sutil e em poucos metros a aeronave já estava parada. E em Santa Cruz o que não falta é pista: são 2.739 metros de extensão, o suficiente para pousar (e decolar) até um Antonov AN-225, o maior avião do mundo, se for preciso. Ao todo, o voo até o Rio levou cerca de uma hora e meia.

Dois dias depois, o mesmo avião nos levou de volta para São Paulo, mas desta vez com um pouco mais de emoção. O espaço aéreo paulistano estava com algumas restrições, devido a uma forte chuva que havia caído e ainda caía em algumas partes da cidade, e o pouso na BASP precisou ser alternado para o PAMA-SP, no Aeroporto Campo de Marte. Apesar do céu mais carregado, a aeronave praticamente não balançou, mesmo quando atravessava as nuvens.

Bandeirante

A FAB possui atualmente mais de 40 C-95 Bandeirantes em serviço (FAB)
A FAB possui atualmente mais de 40 C-95 Bandeirantes em serviço (FAB)

O EMB-110 Bandeirante, ou C-95 na designação militar, é o “cavalo de carga” da Aeronáutica. Praticamente todas as bases da FAB contam com pelo menos um desses aparelhos, que todos os dias cumprem missões de transporte de pessoal e carga. O modelo também pode ser utilizado no lançamento de soldados paraquedistas, por meio de uma porta lateral.

Os Bandeirantes militares, os primeiros aviões fabricados pela Embraer na década de 1970, são veteranos, mas ainda têm muita lenha para queimar. Desde 2012, a FAB opera a versão modernizada da aeronave, com uma série de atualizações de sistemas e na estrutura. Ao todo, a frota conta com 44 aparelhos desse tipo, que devem continuar voando por pelo menos mais 20 anos.

Nota do editor: Agradecimento especial ao Major Garcês, da assessoria de imprensa da FAB, que enviou o convite, e ao Coronel Pedra, que recebeu o Airway na Base Aérea de Santa Cruz. 

Veja mais: Voando no jato executivo Embraer Legacy 650

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  1. Thiago muito interessante o texto e nos dá uma ideia de como é o serviço do CAN e demais voos militares, porém faço uma observação o voo de SP pro Rio sobrevoa a baía da Ilha Grande em Angra dos Reis não a região dos Lagos, que seria sobrevoada em voo em direção a Vitória/ES por exemplo.

  2. Esqueceu de dizer que o Bandeirantes não tem cabine pressurizada. Deve dar uma dor de ouvido e uma sensação horrível.

  3. Muito bom seu texto! Fiquei emocionado com a a narrativa, afinal foram 3.5 mil horas de Bandeirante ao longo da minha carreira na FAB. Avião barulhento, sim, quente no verão e frio no inverno, além de “meio” desconfortável, mas muito confiável! Grande abraço.

  4. A cerca de 20 anos atras fui de SP a Ponta Grossa de Bandeirantes, me lembro até agora da viagem, muito boa e de poder apreciar a paisagem, ótima matéria, parabéns

  5. Eu voei muito como passageiro nesses aviões da FAB era uma delícia, tanto no bandeirante quando no bufalo.
    O bandeirante normalmente voava a 9000 ou 10.000 pés. dependendo da proa por não ser pressurizado.
    E claro, os aviadores da FAB são muito fodas!!!! Tem a máquina na mão de forma muito simples.
    Parabens pela reportagem, só corrijam o texto quanto a altitude, não é possível chegar a 6.000m com bandeirante, o que daria 19600 pés. sem pressurização é complicado.

  6. Senhor Vinholes

    O senhor sabe quem foi Osires Silva?

    Pergunto porqueo meu post foi ignorado .
    e eu fiz uma singela homenagem nesta pagina a um homem que possibilitou o seu voo /convite. Lamento ….

  7. Já fiz uma viagem do aeroporto Santos Dumont à Base Aérea de São Paulo, em Cumbica, há mais de vinte anos quando ainda era militar da FAB. A ida ao Rio tinha sido em um Seneca, também da FAB. Ler essa reportagem foi como voltar no tempo.

  8. Muito legal a materia! Só quem ja voou de turbo hélice sabe a emoção!(saudade do Electra!). Certa vez fui com um amigo norte americano que estava visitando o Brasil de Congonhas a Juiz de Fora num Bandeirante e com seus 2mts de altura sofreu no mini banco mas eu me diverti muito pois alem do desconforto, cabine não pressurizada e ruído ele lembra disso até hoje!!!

  9. Voei num bandeirantes em 1973, era exatamente desse jeitinho. Legal lembrar das cadeiras de costas para as janelas. O consolo é que era novinho.

  10. Olá Marino, sei sim! Fique de olho aqui no Airway, em breve teremos uma matéria que vai te agradar muito, abs!

  11. Por cerca de 1 ano e meio fui passageiro no EMB-110 (o velho e eficiente Bandeirante). Utilizava uma linha que ia de São Paulo a Juiz de Fora, em meados dos anos 80, linha esta que era praticada pela extinta Nordeste Linhas Aéreas. Conheci todos os comandantes e tripulantes, todos eles de uma competência e humildade incríveis.
    Infelizmente a memória não ajuda e esqueço seu nome, mas me lembro de um comandante em especial que fazia questão de extrapolar os limites do Bandeirante e voava acima dos 10.000 pés. Era de um frio tenebroso mas, para falar a verdade, era uma aventura só! Adorava aquilo… me fazia sentir o gostinho dos pioneiros da aviação. Sentia um vento gélido fluindo pelo corredor do pequeno avião e era uma sensação única.

    Nessa mesma época, tive o prazer de desfrutar algumas vezes do maravilhoso Electra da Varig em suas derradeiras viagens entre a ponte São Paulo-Rio. Adorava a “cozinha”, onde meus colegas e eu conversávamos e podíamos desfrutar um Whisky oferecido pela companhia, balançando entre uma turbulência e outra (sem contar um cigarrinho, que era permitido naqueles tempos e eu adorava, me perdoem os puristas).

    Voar era mesmo um evento único… vivi uma época cuja glória de estar nos céus era valorizada ao extremo…. Mas acabou-se!

    Saudades e rendo aqui minha homenagem ao bravo Bandeirante e principalmente àqueles que o conduziram (e conduzem!). Quem me dera reviver essa sensação………….. Parabéns pela matéria, Ricardo!!!

  12. No fim dos anos 80, voei num Bandeirante da Rio-Sul na rota Congonhas – Blumenau – Porto Alegre. É um fusquinha voador, lembro d viagem até hoje!

  13. Apesar de se passar mais de 20 anos, sou um saudosista da FAB, servi por 6 anos e já peguei carona em um Búfalo partindo do Campo de Marte para o Galeão no RJ. Muito emocionante!

  14. Voei três vezes de Recife à Fernando de Noronha dos Bandeirantes da extinta Nordeste Linhas Aéreas, de 1991 à 1994.
    Todas as vezes peguei turbulências muito fortes desde Jaboatão dos Guararapes.
    Passado o susto inicial, era uma beleza, mas confesso que prefiro os voos de hoje com 737 ou os jatos da Embraer.
    Abraços e adorei a matéria.

  15. Relembrar é viver…
    Fiz meu primeiro vôo de Bandeirante em 1976, de São José do Rio Prêto à São Paulo (Congonhas) pela estinta VASP, inclusive tinha um lanche em uma caixa de papelão onde tinha, um palito de dente, sonho de valsa, um misto frio, copo de água mineral é um guardanapo!!!!
    É o tempo passa rápido demais…
    Abraço…

  16. Fui militar no PAMA-SP e voei muito neste aparelho de 1980 a 1989, excelente avião da nossa Embraer. Fui mecânico tanto do Bandeirante quanto do Buffalo no Hangar 20, muito legal essa reportagem! Me fez lembrar meu tempo de sargento na FAB e minha época de novinho! Muito Obrigado! Fiquei muito emocionado pelas imagens e pelo texto! Vocês estão de Parabéns valorizar nossos militares da FAB!

  17. Bandeirante, a primeira vez que entrei em um avião foi num desses na linha de montagem deles em 1982, pena que não voei, mas meu primeiro voo foi no segundo protótipo do Brasilia.

  18. Por volta dos anos 1972,fiz uma viagem de emergência de Brasília ao Rio de Janeiro num desses aviões,levava 2 crianças que foram no colo,por falta de lugar.Me lembro que muitos militares estavam sentados no chão.Foi uma aventura e tanto.Valeu FAB,hoje conto esta história para os netos.

  19. Muito bom o texto, revivi a viagem e a aventura com voce, enquanto li. Fiz Sao Jose dos Campos – Rio algumas vezes de Bandeirantes, só que comercial. A vista é mesmo incrivel, quando o ceu está limpo. Mas já peguei turbulencias muito malucas sem ver nada… E sempre saia do aviao surdo por causa do ruido e da falta de pressurizacao, acho… Mas concordo que era divertido. Imagino num aviao militar.

  20. Sou militar da FAB e voo atualmente o C-95AM 2283 do IPEV em Sao José dos Campos. A galera não acredita quando falo do calor!! Certa vez pousamos no Santos Dumont e, para retornar a SJC, enfrentamos no táxi uma fila de 5 aeronaves. Naquele dia fazia 38° lá fora, 49° dentro do avião porque o ar condicionado do Bandera realmente não é efetivo com o motor em regime de marcha lenta, além de o escapamento dos motores serem direcionados para a fuselagem. O avião é quente, desconfortável, mas sensacional! Uma confiabilidade sem igual, os motores PT6 são um caso a parte. A versão modernizada então, nada deve para os sistemas mais modernos. É até engraçado quando o controlador pergunta se a anv realiza RNAV e a resposta da tripulação é um SIM bem sonoro!

    Parabéns pela matéria, foi realmente diferenciada!! Sucesso!!

  21. Olá Lucas, muito legal seu relato! Apesar do desconforto, realmente é incrível voar nesse avião. Eu, pessoalmente, adorei e queria muito ter uma nova chance de voar no Bandeirante. Obrigado e bons voos no “Bandera”!

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